O cloreto de sódio (NaCl), amplamente conhecido como sal de cozinha, é fundamental para a alimentação humana, desempenhando funções essenciais no equilíbrio hídrico, na transmissão de impulsos nervosos, na contração muscular e no controle do equilíbrio ácido-base do organismo. Ele regula a quantidade de água no corpo, facilita a comunicação entre as células nervosas e é indispensável para a contração muscular, além de ajudar a manter o pH sanguíneo adequado. Embora seja vital para diversas funções fisiológicas, seu consumo deve ser moderado para evitar problemas de saúde, como hipertensão. Além de contribuir para o sabor e conservação de alimentos, o sal é particularmente relevante na preservação de produtos como o queijo, onde sua presença é essencial (NASCIMENTO, 2023).
Função do sal no processo de produção do queijo
A função do sal no processo de produção do queijo é multifacetada e crucial para a qualidade e segurança do produto final. Durante a fabricação do queijo, o sal desempenha diversas funções essenciais (COSTA et al., 2017; FOX et al., 2017; MURTAZA et al., 2014), tal como demonstrado na Figura 1.
Figura 1. Principais funções da adição do sal em queijos
Fonte: Dos autores, 2025.
Controle da umidade: O sal atua promovendo a desidratação do queijo, ajudando a reduzir a quantidade de água presente na massa. Ao remover parte da umidade, o sal contribui para a textura desejada do queijo, tornando-o mais firme e consistente. Esse controle de umidade também é importante para o amadurecimento do queijo, pois a baixa umidade ajuda na concentração de sabores e na formação de uma estrutura mais densa.
Formação da crosta: O sal é responsável por promover a formação da crosta externa do queijo. A aplicação do sal na superfície do queijo ajuda a criar uma camada protetora que não só melhora a aparência, mas também impede que o queijo perca água excessivamente, equilibrando a umidade entre o interior e o exterior do produto. Isso é especialmente importante em queijos de casca firme, como o queijo parmesão e o queijo gouda.
Controle do sabor: Além de suas funções estruturais e de preservação, o sal também desempenha um papel crucial no desenvolvimento do sabor do queijo. Ele ajuda a equilibrar os sabores, realçando os sabores naturais do leite e dos microrganismos presentes durante o processo de fermentação. O sal também pode influenciar a intensidade do sabor e a percepção de salgado no produto final, dependendo da quantidade utilizada.
Inibição de microrganismos: O sal é um conservante natural que auxilia na preservação do queijo. Ao reduzir a quantidade de água disponível para os microrganismos, o sal inibe o crescimento de bactérias indesejadas e fungos, o que ajuda a prolongar a vida útil do queijo. Essa ação bactericida e fungicida é especialmente importante em queijos frescos ou que não am por processos de maturação que envolvem outras técnicas de preservação.
Desenvolvimento de características sensoriais: O sal também tem um impacto direto nas características sensoriais do queijo, como textura, aroma e aparência. Em queijos curados, por exemplo, o sal ajuda a desenvolver a crosta e a textura desejada, enquanto também influencia o processo de maturação, onde as bactérias e enzimas presentes no queijo começam a transformar os compostos lácteos em novos sabores e aromas.
Impacto do sal na conservação e longevidade dos queijos
O sal é crucial para a conservação dos queijos, principalmente devido à sua capacidade de controlar o ambiente microbiológico. Ele reduz a quantidade de água disponível para os microrganismos, criando um ambiente hostil para bactérias e fungos deteriorantes, como Lactobacillus, Pseudomonas e fungos, responsáveis pela deterioração e alterações de sabor. Ao diminuir a atividade da água, o sal também limita o crescimento de microrganismos patogênicos, como Listeria monocytogenes, Salmonella e Escherichia coli, que podem contaminar o queijo e representar riscos à saúde. Essa ação antimicrobiana é especialmente importante em queijos frescos ou com menor acidez.
Além disso, o sal influencia o pH do queijo, favorecendo as bactérias lácticas benéficas, como Lactococcus e Lactobacillus, que ajudam a manter o ambiente ácido e inibem o crescimento de microrganismos indesejáveis. Em queijos curados ou maturados, o sal é ainda mais fundamental, pois controla a umidade e permite que o processo de maturação ocorra de forma segura, preservando a qualidade do queijo ao longo do tempo. Ele também contribui para a formação da crosta protetora, evitando a perda excessiva de umidade e a contaminação por microrganismos, enquanto favorece o desenvolvimento de uma textura firme e estável (MURTAZA et al., 2014).
Ajustes no uso de sal: menos sal e queijos saudáveis
Com a crescente demanda por alimentos mais saudáveis e com menor teor de sódio, há uma tendência para reduzir a quantidade de sal nos queijos. Este tema também pode abordar os desafios enfrentados pelos produtores de queijos em equilibrar sabor, conservação e teor de sal, e as alternativas para substituir o sal ou reduzir seu uso sem comprometer a qualidade do produto.
O consumo excessivo de sal no Brasil é uma preocupação significativa para a saúde pública. Estudos indicam que a ingestão média diária de sal pelos brasileiros é de aproximadamente 9,34 gramas, quase o dobro da recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS, 2011), que sugere um limite de 5 gramas por dia.
O consumo de laticínios corresponde a 11,8% da ingestão diária de sódio da população brasileira, conforme dados do Ministério da Saúde (2011). Em resposta a essa realidade, foi implementado o Plano Nacional de Redução de Consumo de Sódio, no qual indústrias alimentícias aderiram de maneira voluntária, comprometendo-se a reduzir gradualmente os níveis de sódio nos alimentos industrializados, com metas a serem atingidas a cada dois anos. Este plano foi desenvolvido em alinhamento com políticas nacionais de nutrição e saúde, com foco específico na prevenção de doenças crônicas não transmissíveis e da obesidade.
Entre 2011 e 2017, foram firmados cinco termos de compromisso entre o Ministério da Saúde e representantes da indústria alimentícia, abrangendo 35 categorias de alimentos, incluindo queijos, como a muçarela e o requeijão. O principal objetivo era reduzir o teor de sódio nesses produtos. Até 2017, foi relatado que 17 mil toneladas de sal haviam sido retiradas do mercado, proporcionando uma melhoria significativa na alimentação da população (AGÊNCIA BRASIL, 2017).
Em 2020, foi promulgada a Instrução Normativa nº 75, que estabelece critérios rigorosos para a rotulagem nutricional de alimentos embalados. Essa normativa determina que produtos com 600 mg ou mais de sódio por 100g devem exibir a informação "alto em sódio" em seu rótulo. Contudo, para os queijos, essa rotulagem será permitida apenas se ingredientes adicionais elevarem substancialmente o teor de sódio.
Tecnologias de redução de sal no queijo
A indústria de laticínios está cada vez mais investindo em tecnologias para reduzir o teor de sal nos queijos, mantendo a qualidade e prolongando a durabilidade do produto. A pesquisa de alternativas naturais ou sintéticas ao sal tradicional também pode ser um ponto interessante para explorar. Esse tema é extremamente relevante para a indústria de laticínios, pois o sal tem um papel multifacetado na produção de queijos, e há desafios em equilibrar suas funções tradicionais com as novas demandas por produtos mais saudáveis (COSTA et al., 2018).
Diversas estratégias estão sendo empregadas com o objetivo de reduzir o teor de sódio na produção de queijo, sem comprometer sua qualidade e segurança (BANSAL; MISHRA, 2020), conforme apresentado na Figura 2.
Figura 2. Principais estratégias para redução do sódio em queijos
Fonte: Dos autores, 2025.
O sal desempenha um papel crucial na produção de queijos, contribuindo não apenas para a preservação e segurança do produto, mas também para o desenvolvimento de suas características sensoriais, como sabor, textura e aparência. Além disso, sua ação antimicrobiana ajuda a garantir a qualidade e longevidade do queijo, controlando o crescimento de microrganismos indesejáveis. No entanto, o consumo excessivo de sódio representa uma preocupação crescente para a saúde pública, especialmente no Brasil, onde os laticínios são responsáveis por uma parcela significativa da ingestão diária de sódio. Como resultado, diversas iniciativas têm sido implementadas, como o Plano Nacional de Redução de Consumo de Sódio e a adoção de tecnologias inovadoras, com o objetivo de reduzir a quantidade de sal nos queijos sem comprometer sua qualidade. A busca por alternativas para minimizar o teor de sódio sem afetar a funcionalidade e as propriedades sensoriais do queijo é um desafio que envolve a indústria, a pesquisa e a conscientização do consumidor, buscando um equilíbrio entre a tradição e as novas exigências nutricionais para uma alimentação mais saudável.
Autores
Dra. Tatiane Teixeira Tavares, Assessora Técnica do Instituto de Laticínios Cândido Tostes – EPAMIG-ILCT.
Dra. Rafaela Teixeira Rodrigues, Professora Coordenadora do Núcleo de Estudos em Queijos (NEQue) do Instituto Federal Sudeste de Minas Gerais, Campus Rio Pomba.
Clarice Coimbra Pinto, Mestranda em Laticínios na Universidade Federal de Juiz de Fora.
Agradecimentos
Os autores agradecem as instituições que contribuíram diretamente para a execução desse trabalho, como a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG), ao Instituto Federal Sudeste de Minas Gerais, Campus Rio Pomba e a Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais - Instituto de Laticínios Cândido Tostes (EPAMIG-ILCT).
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Referências bibliográficas
AGÊNCIA BRASIL. Acordo com indústria retira mais de 17 mil toneladas de sal dos alimentos. 2017 Disponível em:https://milkpoint-br.informativomineiro.com/geral/noticia/2017-06/acordo-com-industria-retira-mais-de-17-mil-toneladas-de-sal-dos-alimentos. o em: 14 fev. 2025.
BANSAL, V.; MISHRA, S. K. Reduced-sodium cheeses: Implications of reducing sodium chloride on cheese quality and safety. Comprehensive Reviews in Food Science and Food Safety, v. 19, n. 2, p. 733–758, 2020.
COSTA, R. G. B. et al. Processamento de queijos. In: CRUZ, A. G. et al. (Eds.). Processamento de produtos lácteos: queijos, leites fermentados, bebidas lácteas, sorvete, manteiga, creme de leite, soro em pó e lácteos funcionais. 1. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2017. p. 11–69.
COSTA, R. G. B. et al. Sodium substitutes in Prato cheese: Impact on the physicochemical parameters, rheology aspects and sensory acceptance. LWT - Food Science and Technology, v. 90, 2018.
FOX, P. F. et al. Fundamentals of Cheese Science. 2 nd. ed. Boston: Springer, 2017.
MURTAZA, M. A. et al. Texture, flavor, and sensory quality of buffalo milk Cheddar cheese as influenced by reducing sodium salt content. Journal of Dairy Science, v. 97, n. 11, p. 6700–6707, 2014.
NASCIMENTO, Rayssa Cruz Lima do et al. Consumo de sódio e saúde pública: extrato do mesocarpo de coco babaçu (Attalea Speciosa) como alternativa para suprir a redução de NaCl em queijo minas frescal. 2023. Tese de Doutorado. Fundação Oswaldo Cruz.
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE- OMS. Review and updating of current WHO recommendations on salt/sodium and potassium consumption. Geneva, Suíça, 2011. 8p.