A deterioração microbiológica causa prejuízos de grande impacto econômico para as indústrias. Leite e derivados lácteos são produtos altamente nutritivos que favorecem a proliferação de diversos microrganismos contaminantes.
Bactérias deteriorantes causam a degradação de proteínas, carboidratos e gorduras, gerando produtos com características sensoriais indesejáveis e impróprios para consumo. Além disso, podem ser patogênicas, provocando intoxicações e doenças ao consumidor (Fusco et al., 2020).
A pasteurização é uma importante medida de segurança que elimina a maioria dos microrganismos presentes no leite. Entretanto, novos métodos de processamento estão sendo desenvolvidos para garantir uma eficiente descontaminação microbiológica com baixo custo. O propósito é acompanhar a tendência de ecologicamente sustentável e suprir a demanda de alimentos frescos, saudáveis e com prazo de validade estendido (Priyadarshini et al., 2019).
Nesse contexto, a Inativação Fotodinâmica de Microrganismos (IFDMO) apresenta a vantagem de não necessitar de altos investimentos financeiros em equipamentos ou mão-de-obra especializada. Essa tecnologia é usada há décadas na medicina e, nos últimos anos, ou a ser estudada em alimentos.
A técnica se baseia na iluminação de um fotossensibilizador (FS; corante não tóxico) para a produção de espécies reativas de oxigênio (ERO’s) altamente tóxicas, capazes de causar a morte de células (Glueck et al., 2017). Entretanto, maiores investigações devem ser feitas em diferentes condições, modelos experimentais e situações práticas para comprovar a empregabilidade da IFDMO e elucidar os detalhes do mecanismo antibacteriano.
Recentemente, o Grupo de Estudos em Qualidade de Alimentos e Microbiologia (EEQUAM) do Departamento de Zootecnia da Universidade Estadual de Maringá (UEM), em parceria com o Núcleo de Pesquisa em Sistemas Fotodinâmicos (NUPESF) do Departamento de Química (UEM), relataram a eficiência da IFDMO em reduzir Pseudomonas fluorescens, a principal bactéria deteriorante de lácteos, em ensaios in vitro e em queijo Minas Frescal (Saraiva et al., 2021).
Atualmente, experimentos são conduzidos com o objetivo de determinar in vitro e em leite fluído o potencial fototóxico de riboflavina e curcumina contra Escherichia coli, Staphylococcus aureus e Pseudomonas fluorescens (Figura 1). Esses compostos apresentam múltiplas propriedades bioativas benéficas, como potencial antimicrobiano e antioxidante, permitindo efeito sinérgico ao ser combinado com a IFDMO (Yu et al., 2022).
Figura 1. Inativação fotodinâmica de microrganismos contaminantes de leite.
Vários fatores foram investigados nessa pesquisa: bactérias contaminantes e deteriorantes de leite, amostras iluminadas e não iluminadas, diferentes FS e diversas concentrações dos FS. Análises de microscopia eletrônica de transmissão foram usadas para caracterizar os danos causados às células.
Além disso, também foram determinadas as alterações provocadas na qualidade do leite, como composição de macronutrientes (proteína, gordura e lactose), peroxidação de lipídios, oxidação de proteínas e cor.
Os estudos in vitro revelam que a técnica é eficiente em fotoinativar altas cargas das bactérias contaminantes. Também houve redução das bactérias no leite, entretanto menor eficiência foi relatada devido a matriz biológica complexa do alimento. Há um consenso entre as pesquisas de que a fotoinativação é menor nas matrizes alimentares quando comparada ao in vitro.
Isso acontece, principalmente, devido a necessidade de os FS’s absorverem os fótons de luz visíveis para gerar ERO’s (Glueck et al., 2017). O leite é um líquido branco opaco que não permite boa penetração da luz (dos Anjos et al., 2020). Para superar essa barreira e encontrar a melhor forma de aplicação do processamento na prática, diferentes métodos de iluminação foram testados (Figura 2).
Foi constatado que o sistema de iluminação interfere nas contagens microbiológicas, sendo possível otimizar a resposta dos tratamentos e manter a qualidade do produto.
Figura 2. Leite iluminado com LED azul para inativação fotodinâmica de microrganismos.
A IFDMO é considerada promissora devido seu baixo custo e ausência de produção de resíduos (Yu et al., 2022). As lâmpadas LED são compactas e econômicas, possuem baixo consumo de energia e vida útil prolongada. Seu uso em indústrias não necessita de treinamento especial e não oferece riscos aos trabalhadores, podendo ser aplicado em ambientes ocupados por pessoas (Josewin et. al.,2018).
Apesar dos mecanismos de ação da PDI ainda não serem completamente compreendidos, as pesquisas comprovam sua eficácia na fotoinibição de variadas bactérias por meio de danos às estruturas essenciais, como a membrana plasmática. Uma vez que a membrana é lesionada, o conteúdo intracelular extravasa, resultando na morte celular. Outra vantagem é o improvável desenvolvimento de resistência pelos microrganismos, pois a IFDMO atua em múltiplos alvos, garantindo morte celular rápida e irreversível (Hamblin et al., 2016).
Portanto, a IFDMO apresenta potencial para substituir e/ou complementar métodos convencionais de processamento industrial. A técnica mostrou capacidade de reduzir contaminações microbiológicas e preservar a qualidade do leite, sendo uma alternativa para produzir alimentos mais seguros e com maior vida de prateleira.
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Referências
dos Anjos, C., Sellera, F. P., de Freitas, L. M., Gargano, R. G., Telles, E. O., Freitas, R. O., Baptista, M.S., Ribeiro, M.S., Lincopan, N., Pogliani, F.C., Sabino, C. P. 2020. Inactivation of milk-borne pathogens by blue light exposure. Journal of dairy science, 103(2), 1261-1268.
Fusco, V., Chieffi, D., Fanelli, F., Logrieco, A. F., Cho, G. S., Kabisch, J., Böhnlein, C., & Franz, C. M. (2020). Microbial quality and safety of milk and milk products in the 21st century. Comprehensive Reviews in Food Science and Food Safety, 19(4), 2013-2049.
Glueck, M., Schamberger, B., Eckl, P., & Plaetzer, K. (2017). New horizons in microbiological food safety: Photodynamic decontamination based on a curcumin derivative. Photochemical & Photobiological Sciences, 16(12), 1784– 1791.
Hamblin, M. R. (2016). Antimicrobial photodynamic inactivation: a bright new technique to kill resistant microbes. Current opinion in microbiology, 33, 67-73.
Josewin, S. W., Kim, M. J., & Yuk, H. G. (2018). Inactivation of Listeria monocytogenes and Salmonella spp. on cantaloupe rinds by blue light emitting diodes (LEDs). Food microbiology, 76, 219-225.
Priyadarshini, A., Rajauria, G., O'Donnell, C.P., & Tiwari, B.K., (2019). Emerging food processing technologies and factors impacting their industrial adoption. Critical reviews in food science and nutrition, 59(19), 3082-3101.
Saraiva, B. B., Rodrigues, B. M., da Silva Junior, R. C., da Silva Scapim, M. R., Lancheros, C. A. C., Nakamura, C. V., Caetano, W., Pereira, P.C.S., de Santana, E.H.W., & dos Santos Pozza, M. S. (2021). Photodynamic inactivation of Pseudomonas fluorescens in Minas Frescal cheese using curcumin as a photosensitizer. Lwt, 151, 112143.
Yu, X., Zou, Y., Zhang, Z., Wei, T., Ye, Z., Yuk, H. G., & Zheng, Q. (2022). Recent advances in antimicrobial applications of curcumin-mediated photodynamic inactivation in foods. Food Control, 108986.