Escolher a cama ideal e garantir o manejo correto no sistema de Compost Barn são questões que geram muitas dúvidas entre os produtores. No Interleite Sul 2024, a zootecnista Karise Fernanda Nogara abordou esse tema em sua palestra “Cuidados essenciais com o manejo e alternativas para a cama do Compost Barn”, fornecendo soluções práticas e orientações aplicáveis para os desafios enfrentados pelos produtores.
Durante o evento, várias questões foram levantadas e, embora algumas tenham sido respondidas ao vivo, outras ficaram pendentes devido ao tempo limitado. Para esclarecer essas dúvidas, Karise preparou respostas detalhadas para 7 perguntas feitas pelos participantes. Confira abaixo as respostas para as principais questões que surgiram.
1 - Hoje, existe comercialmente uma oferta de produtos que contribuem e aceleram a elasticidade da cama, qual a sua opinião? Indica o uso de cal?
Atualmente, o mercado oferece diversos produtos para aplicação na cama, mas é importante analisar cuidadosamente sua composição. Muitas vezes, esses produtos contêm bactérias anaeróbias, que se desenvolvem em ambientes sem oxigênio. No entanto, para que o processo de compostagem funcione adequadamente, é essencial atender a três pilares fundamentais:
- Combustível: carbono proveniente dos materiais da cama e nitrogênio dos dejetos dos animais.
- Oxigenação: garantida pela aeração adequada (revolvimento da cama).
- Presença de bactérias aeróbias: organismos que dependem de oxigênio para sobreviver e atuar no processo de compostagem.
Portanto, a aplicação de produtos que contenham bactérias anaeróbias contraria os princípios básicos da compostagem, comprometendo sua eficiência. É fundamental priorizar materiais de reposição e práticas que favoreçam o ambiente aeróbio na cama, garantindo o sucesso do processo.
Não, o uso de cal, especialmente a cal hidratada, não é indicado para camas de compost barn. A cal tem a função de aumentar o pH e alcalinizar o ambiente, reduzindo a atividade de água e a proliferação microbiana. Embora essa propriedade seja útil em outros contextos, é negativo neste sistema, onde a atividade microbiana é fundamental. A compostagem depende da multiplicação de bactérias aeróbias para decompor os dejetos e gerar calor, processos essenciais para manter a cama funcional e saudável.
A ideia de utilizar aditivos para secar a cama é tentadora, mas a solução ideal está no manejo correto. Isso inclui práticas como revolver a cama regularmente para promover oxigenação, manter uma relação carbono:nitrogênio adequada, melhorar a ventilação no galpão, e, se necessário, ajustar a profundidade da cama e a frequência de reposição do material. Portanto, o manejo eficiente é a chave para manter a cama seca e funcional.
2 - Pensando em organizar uma cama com temperatura abaixo de 40°C e umidade, existe uma medida correta por metro quadrado de ordem? Se sim, qual?
Se a cama apresenta temperatura abaixo do ideal (entre 43 e 60°C) é provável que a umidade esteja excessiva, o que compromete o processo de compostagem. Nessas situações, algumas medidas são necessárias para corrigir o problema. Para camas compactadas, deve-se aumentar a frequência de revolvimento, utilizando enxadas rotativas para quebrar torrões e melhorar a aeração. Também é recomendada a reposição do material da cama, caso esteja saturado (relação carbono:nitrogênio [C:N] inferior a 25:1), além de garantir maior ventilação no ambiente, mantendo os ventiladores ligados para promover a secagem da cama e a circulação de ar.
Prevenir problemas é sempre a melhor estratégia. Assim, o produtor deve evitar superlotar a cama no início da atividade, adotando uma densidade mais conservadora. Estudos indicam que a área ideal para o funcionamento adequado da compostagem é de 10 a 15 m² por animal em climas moderados, enquanto regiões mais úmidas podem demandar até 20 m² por vaca. Uma margem de segurança amplamente utilizada é 16 m² por animal, suficiente para a maioria das condições. No entanto, esta densidade pode ser ajustada em função do clima e em caso de vacas de menor porte, como as da raça Jersey, as quais podem ser acomodadas em áreas menores, especialmente quando há boa ventilação natural.
A ventilação é um elemento crucial para o sucesso do manejo da cama. Além de reduzir a umidade e ajudar na manutenção da temperatura ideal, ventiladores contribuem para o bem-estar dos animais, minimizando o estresse térmico, melhorando a qualidade do ar e facilitando a saída de gases. Assim, um manejo adequado, combinado com infraestrutura planejada, é essencial para garantir condições ideais tanto para o processo de compostagem quanto para o conforto dos animais.
3- Qual o prazo mínimo/máximo recomendado para a reposição da cama?
A frequência de reposição dos materiais na cama depende diretamente de sua condição, da disponibilidade e do custo dos insumos. Idealmente, a cama deve ser iniciada com materiais que apresentem uma boa relação C:N, como serragem e maravalha, pois esses garantem maior sustentação à produção de calor, essencial para o processo de compostagem.
Com manejo adequado, a cama pode durar até quatro anos, sendo necessário apenas realizar retiradas e reposições estratégicas. Fatores como densidade animal, clima, ventilação, qualidade do material e frequência de revolvimento são determinantes para a longevidade da cama. Pequenas reposições podem ser realizadas a cada 15 dias, mas, dependendo das condições, o produtor pode optar por adicionar maiores quantidades em intervalos mais amplos, como mensalmente.
O momento ideal para reposição parcial ocorre quando a relação C:N da cama está abaixo de 25:1 ou quando a umidade se aproxima de 60%. Nessas situações, recomenda-se adicionar de 10 a 15 cm de material (em altura) para restabelecer o equilíbrio necessário ao processo de compostagem. Entretanto, se a relação C:N cair abaixo de 15:1, a compostagem torna-se praticamente inviável, e apenas reposições não resolvem o problema. Nesse caso, é necessário retirar toda a cama e iniciar um novo lote.
Manter uma relação C:N equilibrada é essencial para minimizar problemas sanitários, como a mastite subclínica. Quanto mais adequado for o substrato para a compostagem, maior será a produção de calor, que pode atingir temperaturas superiores a 54°C, eliminando bactérias patogênicas e garantindo uma superfície seca e segura para os animais.
A frequência de reposição pode variar conforme a época do ano, sendo recomendável que o produtor mantenha um estoque de materiais em local coberto para garantir disponibilidade imediata. Além disso, a granulometria e a forma física dos materiais utilizados devem ser consideradas para favorecer o processo de compostagem e a estabilidade da cama. A troca completa da cama deve ser avaliada com base em funcionalidade (condição) ou em necessidades específicas, como uso de adubo em lavouras ou altura da mureta. No momento da troca é indicado deixar 5 a 10 % da cama para acelerar o processo de compostagem (DAMASCENO et al., 2020).
4- O uso da casca de arroz na cama como alternativa na ausência de maravalha é aconselhável? Qual seria uma boa proporção de casca de arroz com maravalha ou serragem?
A casca de arroz pode ser utilizada como material alternativo na cama, mas apresenta limitações significativas. Por ter baixa capacidade de absorção de umidade e conter sílica em sua composição, a degradação por microrganismos torna-se mais difícil, retardando o processo de compostagem. Além disso, a casca de arroz possui baixo teor de carbono, um elemento essencial para o equilíbrio da relação C:N, fundamental na compostagem.
Para maximizar seu uso, recomenda-se misturá-la com outros materiais mais ricos em carbono, como serragem ou maravalha, sendo ideal limitar sua proporção a cerca de 40% da composição total da cama. Isso ajuda a equilibrar a relação C:N e melhora a eficiência do processo de compostagem (60:40 – 60% de serragem ou maravalha e 40% de casca de arroz).
Comparando os materiais, a maravalha consegue absorver o dobro de seu peso em água, enquanto a casca de arroz absorve apenas metade, tornando esta última menos eficiente no controle da umidade da cama. Além disso, o uso isolado da casca de arroz pode causar irritações na pele dos animais, como lesões no úbere e nos tetos, devido à sua superfície abrasiva.
Portanto, embora a casca de arroz possa ser utilizada, sua aplicação deve ser planejada e sempre associada a outros materiais mais adequados para garantir o conforto animal e a eficiência da compostagem.
4- Pode ser utilizado uma mistura de materiais como cama de compostagem? Ou você pode ir alternando?
A utilização de uma mistura de materiais na cama de compostagem é uma estratégia eficaz, especialmente quando é possível combinar pelo menos três tipos de materiais. Para obter melhores resultados, é importante incluir:
- Um material rico em carbono, como serragem ou maravalha, que promove uma maior atividade microbiana, essencial para o processo de compostagem. Pode ser utilizado numa proporção de, aproximadamente, 50%
- Um material de carbono moderado, que contribua para uma compostagem mais lenta, garantindo a estabilidade do processo ao longo do tempo. Pode ser utilizado numa proporção de, aproximadamente, 25%
- Um estruturante físico, com partículas maiores como cavacos de madeira, cuja principal função é evitar a formação de torrões e proporcionar maior firmeza, evitando a compactação da cama. Também pode ser utilizado numa proporção de, aproximadamente, 25%.
Outro aspecto crucial é o tamanho das partículas dos materiais utilizados. Recomenda-se que tenham entre 2,5 e 4 cm de comprimento e 2 a 3 mm de espessura, pois essas dimensões favorecem o crescimento e reprodução de microrganismos e a eficiência do processo de compostagem. Cavacos maiores (>50 mm) são bons estruturantes físicos e devem ser usados em conjunto com materiais mais finos de forma estratégica, como serragem, para equilibrar as propriedades da cama.
Além da mistura, também é possível alternar os materiais de acordo com a disponibilidade, desde que se mantenha atenção à relação C:N e à capacidade de absorção de umidade dos componentes. Essa flexibilidade ajuda a adaptar o manejo às condições locais, garantindo uma cama funcional e eficiente para o conforto animal e a compostagem.
5- Como instruir o produtor sobre o benefício de revolver a cama? Quantas vezes deve ser realizado?
O revolvimento da cama é uma prática fundamental para garantir o funcionamento adequado do sistema de compostagem. Ele oferece dois benefícios principais: mistura os dejetos dos animais depositados na superfície e promove a oxigenação da cama. Esse manejo cria condições ideais para a ação de bactérias aeróbias, essenciais para a compostagem, já que elas decompõem os substratos da cama (dejetos como fonte de nitrogênio e materiais da cama como fonte de carbono).
A atividade metabólica das bactérias gera calor, aquecendo a cama, o que ajuda a controlar a umidade, eliminar patógenos e criar um ambiente saudável para os animais. Para manter essas condições, o revolvimento deve ser realizado pelo menos duas vezes ao dia em situações normais. Em períodos de alta umidade relativa ou dias chuvosos, recomenda-se aumentar a frequência para até três vezes ao dia.
O revolvimento pode ser feito com implementos como escarificadores ou enxadas rotativas, sendo esta última ideal para quebrar agregados e melhorar a uniformidade do material. A profundidade do revolvimento deve alcançar no mínimo 25 cm e idealmente até 30 cm, dependendo da altura da cama, que geralmente é de 30 a 40 cm no início da sua atividade. É importante evitar que o implemento alcance o solo, mantendo uma margem de segurança para prevenir contaminação com terra.
Durante períodos de chuva, além de intensificar o revolvimento, é aconselhável baixar cortinas nas laterais do galpão para impedir a entrada de água na cama, o que poderia comprometer o processo de compostagem (principalmente se não houver beirais). A constância no revolvimento e a manutenção da oxigenação adequada são cruciais para o equilíbrio da atividade microbiana, que garante o desempenho térmico e sanitário da cama.
Com esses cuidados, o produtor pode assegurar uma cama funcional, capaz de proporcionar conforto aos animais e manter a qualidade do ambiente de produção.
6- Há produtores que questionam a construção leste-oeste, afirmando que com mais sol a cama se mantem mais seca, mas os animais pegam mais sol. Qual sua opinião?
A orientação leste-oeste, com a cumeeira longitudinal a essa direção, é amplamente recomendada porque favorece a criação de áreas com maior sombreamento dentro do galpão ao longo do dia, melhorando o conforto térmico dos animais. Embora seja verdade que a incidência de sol possa contribuir para a secagem da cama em locais úmidos, isso não deve ser o principal critério na escolha da orientação do galpão.
A secagem da cama deve ser alcançada por meio de práticas adequadas de manejo, como o revolvimento regular e a ventilação eficiente, que mantêm a cama seca e confortável. Permitir que o sol incida diretamente sobre os animais confinados pode comprometer seu bem-estar, aumentando o estresse térmico. Isso pode levar à concentração de animais em áreas sombreadas, causando acúmulo de dejetos nesses pontos e prejudicando a qualidade da cama.
Além disso, o conforto térmico é um dos principais fatores que impactam diretamente na produção de leite, além de agravar problemas com moscas e carrapatos no verão. Ambiências bem planejadas não apenas promovem o bem-estar animal, mas também resultam em retornos econômicos rápidos e significativos. Portanto, a orientação leste-oeste é mais vantajosa, pois prioriza a ambiência do galpão e o bem-estar dos animais, garantindo um ambiente mais estável e produtivo ao longo do tempo.
O manejo correto da cama do Compost Barn é fundamental para garantir o bom funcionamento da compostagem e o conforto dos animais. As respostas fornecidas pela Karise Nogara esclarecem dúvidas importantes para otimizar esse processo. Se você ainda tem dúvidas sobre o manejo da cama no Compost Barn, continue acompanhando o MilkPoint para ver mais perguntas respondidas pela zootecnista. Aproveite para deixar sua pergunta nos comentários.