Manter a eficiência de um rebanho leiteiro é um desafio constante, que exige não apenas dedicação diária, mas também o acompanhamento preciso de diversos indicadores zootécnicos. No entanto, essa tarefa nem sempre é simples, e por isso, muitos desses indicadores acabam sendo negligenciados. Dentre eles, o período de serviço pode ser considerado o que norteia todos os demais.
A partir desse indicador, tem-se de forma clara o desempenho reprodutivo do rebanho, pois ele reflete diretamente no intervalo entre partos, as taxas de fertilidade, concepção e gestação, entre outros parâmetros.
Impactos do prolongamento do período de serviço
Para que o sistema de produção leiteira seja eficiente, a vaca precisa produzir um bezerro por ano. Isso significa manter um intervalo entre partos próximo de 12 meses (365 dias). Para alcançar esse objetivo, o período de serviço, ou seja, o tempo entre o parto e a próxima concepção, deve ser, idealmente, de até 85 dias. Sabe-se, no entanto, que nem sempre tudo sai conforme o ideal. Por isso, um período de serviço entre 85-115 dias ainda é considerado aceitável, resultando em um intervalo entre partos de até 13 meses, o que pode ser suficiente para preservar a eficiência reprodutiva do rebanho.
Manter o intervalo de partos em 12 meses é fundamental justamente porque está diretamente relacionado à redução do período de serviço. Quando esse período se prolonga além do ideal, evidencia-se que as taxas de fertilidade e concepção não estão satisfatórias. Como consequência, aumentam os dias improdutivos, com vacas permanecendo no rebanho, gerando custos, mas sem contribuir efetivamente para a renovação do ciclo produtivo.
Esse cenário impacta negativamente o Índice de Eficiência de Produção (IEP), pois um rebanho com vacas improdutivas representa maior custo sem o devido retorno financeiro, comprometendo a rentabilidade do sistema. Como se costuma dizer:“vaca boa é a que tem leite e bezerro à vista”.
Por isso, é importante entender que o único momento em que se tem abertura real para interferir na redução do intervalo entre partos é durante o período de serviço. O período de gestação é fixo (em média 280 dias), ou seja, é no intervalo entre o parto e a nova concepção que está a janela de oportunidade. A eficiência com que se realiza os manejos que antecedem esse momento — como o período de transição, o controle de doenças metabólicas e o manejo nutricional —, bem como as ações realizadas dentro dele, como o momento de início da reprodução e as estratégias adotadas para alcançar a concepção, vão determinar se essa vaca permanecerá dentro do tempo ideal ou se ultraará os limites aceitáveis (85-115 dias).
Os desafios metabólicos do início da lactação
“Mas, se já se sabe de tudo isso, por que ainda é tão difícil alcançar esse resultado na prática?”, a resposta está na complexidade do momento. Na Figura 1, estão detalhados os principais desafios fisiológicos e metabólicos enfrentados por uma vaca no início da lactação.
Figura 1. Esquema dos Desafios Fisiológicos e Metabólicos de uma vaca no início da lactação
Início da lactação (0 a 90 dias pós-parto):
O início da lactação é o período de maior produção de leite e menor ingestão de matéria seca, sendo que o pico de produção ocorre antes do pico de consumo. Nesse período a vaca perde peso, mobiliza reservas corporais e está sob balanço energético negativo.
Subdivisões importantes:
- Primeiras 3 semanas: ainda parte do período de transição; alto risco de doenças.
- Até 60 dias: momento de espera voluntária e início do manejo reprodutivo.
- Até 90 dias: busca-se o retorno à ciclicidade e concepção precoce.
Em grande parte, o problema começa antes mesmo do parto, quando a vaca chega a esse momento com escore de condição corporal (ECC) abaixo do ideal. Isso compromete sua capacidade de enfrentar as exigências do início da lactação, mobilizar reservas corporais de forma equilibrada e se recuperar com eficiência. Sem essa base adequada, as chances de a vaca sair do anestro, retomar a ciclicidade e conceber dentro do período de serviço se tornam significativamente menores.
O cenário do balanço energético negativo, leva à hipoglicemia, hipoinsulinemia, aumento do hormônio do crescimento (GH), pela necessidade de mobilizar reservas corporais, e à inibição da liberação de GnRH, que estimula a secreção dos hormônios reprodutivos. Com isso, os hormônios luteinizante (LH) e folículo-estimulante (FSH) deixam de ser produzidos adequadamente, comprometendo a ovulação e mantendo o animal em anestro.
De forma clara, o organismo entende que não há condições para gerar uma nova vida, já que precisa priorizar sua própria sobrevivência. Se o corpo está mobilizando reservas, ele naturalmente bloqueia a produção de hormônios reprodutivos.
Porém, quando a vaca chega ao parto com escore corporal ideal, mesmo com a inevitável mobilização das reservas no início da lactação, o organismo consegue manter o equilíbrio. Isso se reflete em níveis adequados de leptina e insulina, melhor captação de glicose e nutrientes suficientes para manter as funções vitais e reprodutivas. O eixo hipotálamo-hipófise-gônadas segue seu fluxo normal, a foliculogênese ocorre, o anestro é superado, e o retorno ao ciclo estral se dá de forma mais rápida. Essa é a resposta esperada no pós-parto: uma recuperação eficiente que permita nova prenhez e continuidade do ciclo produtivo da vaca.
Por outro lado, também há um importante desafio relacionado ao manejo reprodutivo. Mesmo quando a vaca supera os desequilíbrios fisiológicos iniciais e retorna à ciclicidade, as falhas no manejo podem comprometer seriamente os resultados reprodutivos. A principal delas é a baixa eficiência na detecção de estro: quando o cio não é identificado no momento certo, a oportunidade de inseminação é perdida, o que prolonga o período de serviço e atrasa o reinício do ciclo produtivo.
Como atingir a eficiência reprodutiva?
Dessa forma, os dois pilares que sustentam a eficiência do sistema de produção são: o adequado escore de condição corporal (ECC) no pré-parto e a eficiência dos manejos reprodutivos. Ao propor estratégias que proporcionem uma melhor situação metabólica para a vaca frente ao balanço energético negativo – como o ajuste nutricional no pré-parto e no início da lactação –, reduz-se significativamente a ocorrência dos principais distúrbios fisiológicos e reprodutivos, o que possibilita que o animal retome mais rapidamente a ciclicidade.
Para melhorar o período de serviço, é necessário ajustar esses dois pontos — ECC e manejo reprodutivo. Garantir que a vaca chegue ao parto com ECC adequado (em torno de 3,5), e em relação ao manejo reprodutivo, a precisão na detecção de cio contribuirá mais de 50% para a redução do período de serviço. Ao alcançar essa redução, o rebanho se torna mais eficiente, refletindo diretamente no aumento do IEP, já que menos vacas improdutivas permanecem, gerando custos sem retorno.
Portanto, melhorar o período de serviço é uma ação estratégica que determina o sucesso reprodutivo e financeiro da atividade leiteira. Quanto mais curto for esse período, mais próximo o rebanho estará de alcançar um intervalo entre partos ideal, refletindo diretamente em maior produção de bezerros e maior eficiência no uso do ciclo produtivo da vaca e, além disso, na minimização dos demais problemas que acompanham esse momento. Com a redução do período de serviço, o IEP melhora, uma vez que menos vacas improdutivas permanecem no rebanho, otimizando a rentabilidade e a eficiência do sistema.