Nesse contexto, podemos citar a Pesquisa Operacional como uma teoria útil com ferramentas para auxiliar os gestores a obterem melhor resultado econômico por realizar decisões corretas. A pesquisa operacional tem natureza multidisciplinar e envolve métodos e técnicas quantitativas para determinar decisões ótimas e estabelecer critérios para alocação de recursos (AZEVEDO FILHO & NEVES, 1988). Um dos modelos mais conhecidos nessa área é a programação linear, um modelo determinístico que diz respeito à alocação de recursos como terra, trabalho e capital, de maneira que se otimizem os custos ou o lucro (REIS & VIEIRA, 1986). O uso de ferramentas matemáticas permite que se teste a coerência da estrutura e do funcionamento de um sistema de produção agropecuária de forma metódica e rigorosa (SILVA NETO & OLIVEIRA, 2009). Podemos utilizar a programação linear para gerar modelos que nos auxiliam na otimização, no processo de alocação de recursos visando maximizar ou minimizar uma função objetivo, que pode ser maximizar lucro ou minimizar custo, por exemplo.
Há poucas pesquisas envolvendo a aplicação da modelagem matemática para otimização da produção de ovinos e caprinos. Podem ser citados modelos desenvolvidos para sistemas de produção de ruminantes em pastagens (MEDEIROS, 2003) e de caprinos leiteiros (GUIMARÃES, 2007; MEDEIROS & PEDREIRA, 2007).
Nesse contexto, o objetivo deste texto foi mostrar como um modelo matemático de programação linear pode gerar resultados e como esses podem ser úteis.
Vamos utilizar a seguinte situação problema:
Um proprietário tem uma propriedade de 18 hectares, sendo que duas áreas podem ser destinadas para desenvolvimento de atividades agropecuárias. A área 01 consiste de sete hectares nos quais há pastagem de hemartria (Hemarthria altissima) implantada. Com a produção forrageira atual cada animal necessitaria de uma área de 0,045 hectares. A área 02 de nove hectares não tem nenhum tipo de cultura implantada e pode ser arrendada. Há disponibilidade de dois funcionários e esses podem ser destinados à produção agropecuária, uma vez que têm tempo disponível já que não há atividade comercial, somente manutenção da propriedade como área de lazer. Nesse contexto, o proprietário deseja tornar a propriedade rentável e para isso quer iniciar a produção de caprinos de corte. Há possibilidade de venda da produção para um frigorífico que abastece um restaurante. No entanto, o comprador deseja também carne ovina e por isso recomendou que também haja produção de cordeiros para abate, mesmo que em menor escala que cabritos. O proprietário tem possibilidade de investir R$ 30.000,00 no primeiro ano. A partir do segundo ano, o investimento a ser realizado seria o valor da receita menos o valor gasto para manutenção dos animais na área.
O que se deseja saber é:
1 - Como otimizar a produção?
2 - Que área usar?
3 - Quantos animais produzir?
4 - É interessante arrendar?
5 - Como distribuir o capital nas atividades possíveis?
Para responder à esses questionamentos o primeiro o foi realizar um estudo de viabilidade econômica e um projeto de implantação das atividades para obtenção dos índices zootécnicos e econômicos. Nesse estudo focamos nas matrizes, ou seja, realizamos todos os cálculos para um ano produtivo a partir de uma cabra ou uma ovelha.
O custo variável referiu-se ao somatório dos valores gastos com: alimentação, pastagem, medicamentos, assistência técnica, energia elétrica, conservação e reparos, impostos e taxas, sendo todos esses custos variáveis com comportamento linear aumentando a medida que se aumenta uma unidade produzida. A receita por animal foi obtida a partir do valor total de venda dos cabritos e cordeiros para abate divido pelo número de cabras ou ovelhas. Considerou-se o valor de R$ 5,00 por quilo para os cabritos e R$ 3,50 para os cordeiros. A margem bruta foi obtida pela subtração do custo variável pela receita. Para estimativa desses valores fez-se um projeto para 150 matrizes ovinas e outro para 150 matrizes caprinas e dividiu-se o custo obtido pelo número de animais. Calculou-se também o investimento necessário para aquisição de cada cabra e ovelha.
Podemos, portanto, considerar três possibilidades de atividades para serem combinadas: criação de caprinos, criação de ovinos e arrendamento da área. Há necessidade de criar as duas espécies animais e o arrendamento pode ser feito se for mais lucrativo que a pecuária, havendo restrições de valores para todas as atividades.
Com os dados formulou-se um modelo matemático de programação linear para encontrar a melhor forma de alocar as atividades produtivas. O objetivo foi maximizar a margem bruta, uma vez que essa tem comportamento linear, pois a cada aumento de um animal terminado há aumento de receita e também de custo variável. Usamos como restrição:
1.O investimento não pode ultraar R$ 30.000,00 no primeiro ano e nos demais não pode ser superior ao saldo entre receita e despesas geradas com a atividade sem considerar mão-de-obra.
2.Devem ser criados no mínimo 30 cabras e 30 ovelhas, bem como um máximo de 200 cabras e 300 ovelhas para garantir um mínimo de crias a fim de atender o restaurante e também que não haja sobra de produção sem ter venda certa.
3.O número máximo de animais na área deve ser de 364 somando cabras e ovelhas.
4.A área máxima para criar os animais é de 16 ha, sendo que no máximo 9 ha podem ser arrendados.
5. O modelo foi resolvido no software L.I.N.D.O. da LINDO Systems Insc., Chigaco, IL, USA) versão 6.1 com programação linear inteira.
Resultados obtidos
Os cálculos produtivos e econômicos revelaram que a criação de caprinos gerou maior receita e margem bruta que a de ovinos (Tabela 1). Isso pode ser explicado pelo maior número de crias das fêmeas caprinas (maior prolificidade) e maior preço pago pelo quilo do animal terminado. Observou-se que o investimento para compra de caprinos foi superior ao da compra de ovinos.
Tabela 1 - Parâmetros econômicos das atividades da propriedade.

No primeiro ano, com investimento de R$ 30.000,00, a indicação para otimizar a margem bruta foi de adquirir 47 matrizes caprinas, 30 ovinas e arrendar a área de 9 ha (Tabela 2). Sendo assim, não houve folga dessa área disponível para arrendamento, pois foi totalmente utilizada, mas houve folga da área para produção animal, de 3,53 ha, que não foram uilizados. Para os caprinos e ovinos respeitou-se a restrição de no mínimo 30 animais, e houve folga de 153 e 270 animais, respectivamente, e do valor total investido sobrou apenas de R$ 202,00. Com esses parâmetros obteve-se margem bruta de R$ 12.634,00 (Tabela 3). Observou-se que três restrições foram atuantes: número mínimo de ovelhas, área para arrendamento e capital para investimento.
No segundo ano, obteve-se R$ 18.381,00 de margem bruta, e após a retirada dos custos chegou-se ao valor de R$ 2.936,00 para investimento. Dessa forma, um novo modelo foi necessário sem haver necessidade de incluir restrição do número mínimo de animais, uma vez que esse já foi atendido. Utilizaram-se restrições de área, estando disponível a folga observada no ano 1 (12,53 ha), do número máximo de animais (153 cabras, 270 ovelhas e 275 animais no total) e de investimento (≤R$ 2.936,00). Manteve-se a possibilidade de continuar com arrendamento da área de nove hectares. Sendo assim, no segundo ano a recomendação foi de adquirir seis cabras e uma ovelha, e manter a área de nove hectares arrendada gerando margem bruta de R$ 5.747,00. Como o custo para manter os animais é variável, quanto maior o número de animais, maior o custo, mas também aumenta a receita por serem terminados mais animais para abate; a cada ano tem-se maior capital para investimento.
No ano 3 foi possível investir R$ 8.512,00 na compra de 20 cabras e 9 ovelhas, e ano 4, R$ 11.559,00 na compra de 20 cabras. Em ambos os casos foi mantido o arrendamento dos 9 ha. Isso pode ser explicado pelo fato dessa atividade não ter investimento, e o capital para esse fim é uma restrição. Mesmo que o valor pago por hectare arrendado fosse de R$ 1,00 haveria indicação de manter essa prática.
A partir do 5° ano, pelo fato de aumentar o capital disponível para investimento, foi possível investir em mais animais diminuindo assim a área arrendada. Dessa forma, neste ano arrendou-se apenas 8 ha e mais 35 cabras foram adquiridas. Uma área que atinja a capacidade máxima de e forrageiro com cabras apresenta uma receita de R$ 5.473,00 e com ovelhas R$ 2.718,00; se comparar com o arrendamento que gera receita de R$ 550,00 é mais rentável ocupar a área com caprinos.
No ano seguinte, mais dois hectares deveriam ser ocupados com produção animal e não mais serem arrendados. Com capital de R$ 19.111,00 disponível para investimento foi possível comprar 45 cabras de modo a maximizar a margem bruta (R$ 51.475,00).
No 7° ano de atividade, haveria R$ 24.600,00 para investimento, no entanto, só poderiam ser adquiridas mais 20 cabras para não extrapolar o limite máximo em que o proprietário consegue vender a produção. Ainda seria possível adquirir ovelhas, pois haveria folga. Portanto, para otimizar a margem bruta atendendo as restrições o ideal seria investir na compra de 19 matrizes caprinas e 50 ovinas. A área de arrendamento deveria ser de três hectares.
E por fim, no 8° ano o proprietário poderia investir o valor de R$ 30.218,00 obtido com a atividade. A recomendação foi de comprar uma cabra e com isso chegaria no limite da produção caprina. Como haveria capital ainda, deveria haver investimento em mais 71 ovelhas. Sendo assim, há necessidade de usar toda a área de 16 ha para produção animal e não realizar mais arrendamento.
Tabela 2 - Indicação do número de animais a serem adquiridos a cada ano, número total de animais na propriedade e área para arrendamento com objetivo de maximizar margem bruta.

Tabela 3 - Resultado econômico das atividades de caprinocultura, ovinocultura e arrendamento de área.

Conclusão
O modelo gerado foi simples e capaz de gerar resultados que permitiram direcionar a estratégia de investimentos do proprietário de maneira mais segura otimizando a margem bruta.
Referências Bibliográficas
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