Alguns pesquisadores defendem que não se forneça feno para os bezerros durante o período de aleitamento, pois algumas pesquisas comprovam que os animais consomem menos concentrado e apresentam baixo desempenho. No entanto, outras pesquisas mais recentes têm mostrado que a introdução de forragem de boa qualidade no período de aleitamento pode melhorar o ganho de peso e a ingestão de matéria seca dos animais. Além disso, alguns autores alegam que o fornecimento de feno pode melhorar a eficiência alimentar caso o concentrado fornecido seja texturizado.
Além do teor de forragem da dieta, o tamanho de partícula influencia o ambiente ruminal, a produção de AGCC, além da estrutura e função das papilas ruminais. O fornecimento de forragens picadas ou moídas finamente podem resultar em redução no pH e da população de bactérias celulolíticas. O tamanho de partícula afeta claramente o ambiente ruminal, no entanto ainda não está claro se o tamanho de partícula ou a quantidade de fibra na dieta de bezerros pré-ruminantes influenciam no desenvolvimento ruminal. Pensando nisto, pesquisadores canadenses avaliaram o efeito do tamanho de partícula da forragem misturado ao concentrado inicial sobre o desempenho e digestibilidade de bezerros. A hipótese dos pesquisadores é que o tamanho de partícula da forragem poderia influenciar no desenvolvimento ruminal de bezerros leiteiros e isto refletiria no aumento do consumo de ração e melhor desempenho dos animais que consumissem forragem com maior tamanho de partícula.
Para este estudo foram utilizados vinte bezerros machos da raça Holandês, com peso ao nascer variando de 45 a 47 kg. Os bezerros foram colostrados e entraram em experimento aos 2 dias de vida. Os animais foram alocados em abrigos individuais e receberam sucedâneo acidificado (22% PB e 18% EE) diariamente, divididos em 2 refeições (8 e 16 h). Nos primeiros 35 dias de vida (5 semanas), os animais receberam 8 litros de sucedâneo/dia (1,2 kg/dia de MS); do 36º ao 38º dia, os animais receberam 6 litros de sucedâneo/dia (0,9 kg/dia de MS); do 39º ao 41º dia os animais receberam 4 litros de sucedâneo/dia (0,6 kg/dia de MS), e a dieta líquida foi sendo reduzida progressivamente até 49º dia, quando os bezerros foram desaleitados.
Os bezerros foram divididos em 2 grupos de 10 bezerros e receberam um dos seguintes tratamentos (com base na MS):
1) 90% de concentrado inicial e 10% de feno moído grosso (3 – 4 cm);
2) 90% de concentrado inicial e 10% de feno moído fino (2 mm).
Os animais aram a receber a dieta sólida a partir do 5º dia de vida e o fornecimento era ad libitum. A composição da dieta sólida é descrita na Tabela 1.
Tabela 1. Composição química dos alimentos e das rações experimentais.
Os bezerros foram pesados e medidos semanalmente. O consumo de água e ração concentrada foi anotado diariamente. Para a determinação da ingestão de matéria seca (IMS) amostras da ração e das sobras foram amostradas duas vezes por semana. A partir da 7ª semana as amostragens de ração e das sobras foram realizadas semanalmente. Todas as amostras foram congeladas a - 20º C. O tamanho de partícula das dietas foi obtido através do separador de partículas Penn State Particle Separator.
Após o desaleitamento, aos 49 dias, sacos plásticos foram colados na região perianal de cada bezerro para determinação da digestibilidade aparente da MS, PB, FDN, FDA das dietas. Na 8ª semana de estudo foi realizada coleta total de fezes. As fezes foram pesadas e levadas para estufa para secagem a 60ºC, em seguida foram moídas a 1 mm. Análises bromatológicas foram realizadas nos alimentos e nas fezes.
O comportamento dos bezerros foi monitorado durante uma semana antes do desaleitamento (semana 6) e uma semana após o desaleitamento (semana 8). Os bezerros foram observados durante uma hora após o aleitamento da manhã (08:30h) e uma horas após o fornecimento do concentrado (10:30h). Após o desaleitamento, a observação das 08:30h permaneceu mesmo que os animais não estivessem em aleitamento. Período de observação foi de 28 horas por bezerro. As observações foram contínuas e foram medidos os seguintes comportamentos: comendo, bebendo, ruminando, comportamentos orais não-nutritivos, dando cabeçadas, em ócio (sem realizar nenhuma das atividades citadas acima).
Resultados
A digestibilidade aparente do trato total da MS, PB, FDA e FDN após o desaleitamento (semana 8) foi maior para os bezerros que estavam recebendo ração grosseira em relação aos bezerros que estavam recebendo ração fina (Tabela 2). Isto pode ser explicado também pela melhor eficiência alimentar dos bezerros consumindo ração grosseira quando comparados aos animais recebendo ração fina (Tabela 3). Aparentemente, o tamanho de partícula da forragem pode desempenhar um papel importante na digestibilidade dos nutrientes. No presente estudo, apesar dos animais que receberam ração grosseira terem consumido mais FDN em relação aos animais que receberam ração fina (Tabela 4), os valores de digestibilidade aparente dos nutrientes avaliados foram maiores nos animais que consumiram ração grosseira. Isto pode estar relacionado a um ambiente ruminal melhor, fazendo com que haja maior digestibilidade dos nutrientes. No entanto, isto pode estar relacionado também a um maior tempo de retenção ruminal da ração grosseira, fazendo com que ocorra uma melhora na digestibilidade, embora isto não possa ser confirmado já que não houve diferenças na ingestão de matéria seca (Tabela 3).
Tabela 2. Digestibilidade aparente dos nutrientes no trato total após o desaleitamento (semana 8) de bezerros recebendo rações contendo feno moído grosso ou feno moído fino
Os dados de desempenho estão na Tabela 3. Não houve diferença para nenhum destes parâmetros avaliados. No entanto, a ingestão de MS foi maior para os bezerros recebendo ração grosseira após o desaleitamento (Figura 1). De acordo com os autores do trabalho, os bezerros consumindo ração grosseira tendem a ser mais eficientes, provavelmente porque a ração grosseira melhora o desenvolvimento do retículo-rúmen, promovendo maior fluxo salivar para o rúmen através da maior mastigação e aumento na ruminação.
Um melhor ambiente ruminal pode contribuir para um aumento na ingestão de sólidos após o desaleitamento e tende a melhorar a eficiência alimentar. Alguns pesquisadores relatam que ao se adicionar de 10 a 25% de feno ou palha na ração ocorre um aumento na ingestão de matéria seca.
Tabela 3. Ingestão e ganho de peso de bezerros alimentados com rações contendo feno moído grosso ou feno moído fino, dos 2 aos 56 dias de idade
Figura 1. Ingestão de MS total (ração + sucedâneo, g/dia) de bezerros alimentados com rações contendo feno moído grosso ou feno moído fino. O asterisco indica diferença significativa entre os tratamentos para P<0,05.
Com relação à ingestão de nutrientes, foram observadas diferenças apenas para a ingestão de FDN, não houve diferenças para a ingestão de PB e FDA (Tabela 4). Os bezerros alimentados com ração grosseira consumiram maior quantidade de FDN quando comparados aos animais que consumiram ração fina, nas duas últimas semanas de experimento (semanas 7 e 8).
Tabela 4. Ingestão de nutrientes durante a última semana de aleitamento (semana 7) e após o desaleitamento (semana 8) de bezerros alimentados com rações contendo feno moído grosso ou feno moído fino
O total de tempo que cada comportamento foi observado está descrito na Tabela 5. Não foram encontradas diferenças para nenhum dos comportamentos observados, a não ser para o tempo realizando comportamentos orais não nutritivos, comportamento este indicativo de mal estar, pois pode estar relacionado à frustação causada pela falta de ruminação. Alguns pesquisadores sugerem que o tamanho de partícula e a oferta de forragem, desempenham um papel importante na redução de comportamentos orais não nutritivos, portanto fornecer forragem grosseira aos animais pode melhorar o bem estar.
Tabela 5. Diferentes comportamentos (tempo médio em minutos) de bezerros alimentados com rações contendo feno moído grosso ou feno moído fino, uma semana antes do desaleitamento (semana 6) e após o desaleitamento (semana 8)
Concluindo, o fornecimento de feno grosseiro melhora a ingestão de MS total e a digestibilidade dos nutrientes após o desaleitamento, quando comparado à adição de feno moído fino. Além disso, o feno grosseiro reduz os comportamentos orais não nutritivos e tende a melhorar a eficiência alimentar durante as primeiras semanas de vida, em relação a animais que recebem feno moído fino.
Referência
C. Montoro, E.K. Miller-Cushon, T.J. DeVries, A. Bach. Effect of physical form of forage on performance, feeding behavior, and digestibility of Holstein calves. Journal of Dairy Science, 96: 1117–1124, 2013.
Comentários
O fornecimento de feno para bezerros leiteiros é uma prática bastante polêmica entre técnicos e pesquisadores. Enquanto o consumo de feno não tem relação direta com o desenvolvimento do rúmen em termos de capacidade absortiva, tem relação com o desenvolvimento muscular ruminal. No entanto, alguns trabalhos começam a mostrar que o fornecimento de feno pode aumentar o consumo de concentrado, provavelmente por garantir uma melhor saúde ruminal, principalmente no que diz respeito a variações no pH. No entanto, o maior problema desta prática no Brasil é a baixa qualidade do feno fornecido aos bezerros. E isso é ainda agravado pelo fato de que alguns animais podem simplesmente substituir o consumo de concentrado pelo de feno, afetando de forma negativa o seu desempenho. Enquanto as rações concentradas tem em torno de 20% de proteína bruta, é comum que o feno fornecido tenha entre 10 e 12% de proteína. Em sistemas de aleitamento convencional, com o fornecimento de 4L/d, este quadro fica ainda mais prejudicado. Assim, antes de qualquer discussão sobre fornecer ou não feno para bezerros, é importante que feno de qualidade esteja disponível.
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