Anteriormente apresentamos como o perfil de ácidos graxos pode ser um indicador da saúde do rúmen (artigo disponível aqui) e como o seu uso, juntamente ao método FCA (Fato, Causa e Ação) e ao da Qualidade da Clínica do Leite (artigo disponível aqui) podem ajudar a solucionar desafios relacionados ao baixo teor de sólidos no leite. Neste artigo iremos relatar o caso de uma fazenda que utilizou essa ferramenta para identificar e solucionar o problema de queda no teor de gordura no leite do tanque.
A fazenda possuí um rebanho da raça Holandesa confinado em galpões free-stall e composto. A dieta das vacas era a base de silagem de milho, pré-secado de capim Jiggs, milho moído reidratado, cevada, farelo de soja, farelo de algodão, caroço de algodão, DDG, polpa cítrica, gordura protegida de óleo de palma e núcleo mineral. Conforme apresentado na Figura 1, a gordura do leite no tanque era consistentemente próxima a 4% durante todo o ano de 2024. Entretanto, em uma tentativa de reduzir o custo da alimentação, em outubro (18/10/2024) foi realizada uma mudança na dieta, a qual ocasionou uma queda abrupta na gordura (Figura 1 – retângulo vermelho) para 3,03%.
Figura 1. da Qualidade da Clínica do Leite mostrando os resultados das análises do leite do tanque no ano de 2024. O retângulo em vermelho destaca o período da queda no teor de gordura.
Usando o da Qualidade da Clínica do Leite e o FCA disponibilizados no artigo anterior, foi feito o entendimento do problema (Figura 2) para, dessa forma, se identificar o verdadeiro problema. A partir das respostas a uma série de perguntas (Figura 2), concluiu-se que o leite do tanque tinha baixa gordura pois o rúmen das vacas estava doente e os ácidos graxos insaturados estavam altos, gerando uma perda mensal de 26 mil reais devido a perdas de bonificação pelo teor de gordura.
Figura 2. Entendimento do problema do FCA
Fonte: Clínica do Leite
Considerando que o verdadeiro problema é a queda no teor de gordura no leite do tanque devido à baixa função ruminal dos animais, os fatos foram levantados na fazenda. Para isso, foi utilizado o diagrama espinha de peixe (Figura 3) do FCA, que lista as potenciais causas do verdadeiro problema em relação a diferentes fatores (ingredientes da dieta, fórmula da dieta, ambiente e processos). Foi identificado que havia excesso de milho moído reidratado na fórmula da dieta que, somado à adição de DDG, estariam gerando uma sobrecarga no rúmen das vacas. No mesmo mês em que foi observada a queda na gordura do leite, a fazenda havia aumentado o milho moído reidratado e adicionado DDG na dieta porque esses ingredientes eram mais baratos. Dessa forma, verificou-se que demais fatos observados, como os vinculados ao Ambiente e Processo, não estavam associados ao verdadeiro problema.
Figura 3. Diagrama espinha de peixe para levantamento dos fatos na fazenda. Círculos vermelho indicam as causas identificadas no caso relatado.
Fonte: Clínica do Leite.
Com base nas causas, foi desenvolvido um plano de ação que basicamente consistiu em ajustar a dieta, conforme o quadro abaixo.
A formulação da dieta anteriormente e durante o período de redução na gordura, bem como após a implementação do plano de ação podem ser observadas na Tabela 1.
Tabela 1. Formulação da dieta no período observado: anterior à redução da gordura no leite (30/09/2024), durante o problema (24/10/2024) e após o ajuste final definido no plano de ação (30/11/2024).
A composição nutritiva da dieta foi alterada, o FDN e a fibra efetiva aumentaram, e a proteína e o amido foram reduzidos. Como consequência, a ELL foi reduzida. Porém, as grandes alterações foram nos ingredientes da dieta, principalmente na redução de milho úmido e DDG, e aumento de silagem de milho.
O progresso das ações implementadas foi monitorado semanalmente com base no resultado das análises da composição de leite do tanque, que incluíam a gordura e o seu perfil de ácidos graxos. A mudança na concentração de gordura (linha azul) e dos ácidos graxos de novo (linha verde) e pré-formados (linha vermelha) ao longo do tempo podem ser observados na Figura 4.
Figura 4. Relatório do Qualidade da Clínica do Leite mostrando a evolução da concentração de gordura e dos ácidos graxos no ano de 2024. O retângulo em vermelho destaca o período de redução na gordura e posterior implementação do plano de ação.
Fonte: Clínica do Leite.
Na figura 5 podem ser observados os resultados das análises do leite do tanque, coletadas pela indústria em 22/11/24. Houve aumento no teor de gordura, mas percebe-se que ainda há espaço para ajustes na dieta, como, por exemplo, aumentar um pouco a polpa de laranja e o caroço de algodão, reduzir o DDG e o farelo de algodão. Essas alterações, no entanto, devem ser feitas gradualmente, em intervalos semanais, para a adaptação dos microrganismos do rúmen. Observou-se que a produção de leite não se alterou, mantendo-se entre 32 e 33 kg/vaca/dia. A melhoria da produção, no entanto, se dará com alterações no conforto dos animais e redução da mastite, e é mais demorada para ser observada do que a composição do leite por motivos fisiológicos que não cabem ser comentados neste artigo. A mudança na composição do leite resultou em um ganho de R$21.000,00 no mês, ou seja, a perda de bonificação foi de R$ 5.000,00 em relação a quando o diagnóstico do problema foi realizado.
Figura 5. Qualidade da Clínica do Leite mostrando os resultados das análises do leite do tanque durante o período de queda no teor de gordura.
Este relato de caso é um exemplo de como a formulação de dieta para vacas de leite pode ser desafiadora na busca do equilíbrio entre o aumento da produtividade animal e a escolha de alimentos para reduzir o custo alimentar. Essa atividade requer uma análise cuidadosa das necessidades nutricionais das vacas, considerando variáveis como a qualidade, composição e digestibilidade dos alimentos e a eficiência desses na conversão de nutrientes. Para lidar com esse desafio, a análise inovadora de componentes do leite do tanque, como os ácidos graxos de novo e pré-formados, se tornam aliados do nutricionista e produtor para realizar ajustes na dieta e monitorar o manejo do rebanho. A redução no custo de alimentação de vacas em lactação deve focar em:
- Produzir forragens de alta digestibilidade
- Manter os ácidos graxos de novo acima de 1,0 g/100g de leite
- Reduzir perdas de estocagem de alimentos
- Não deixar as vacas engordarem
- Reduzir perdas de alimentos: mofo, vento, umidade, silagem butírica
- Remover ingredientes desnecessários das dietas
- Não desperdiçar farelo de soja (proteína)– NUL entre 8 e 12 mg/dL
Embora o presente caso esteja relacionado à influência da composição da dieta sobre o teor de gordura, é importante reforçar que uma série de fatores de manejo também afetam o teor de sólidos no leite. Competição no cocho, número de vezes que o alimento é empurrado para o cocho durante o dia, qualidade de mistura da dieta e sobra são exemplos de variáveis ligadas ao manejo que impactam à produção dos ácidos graxos de novo, e consequentemente, o teor de sólidos no leite. Se tiver quaisquer dúvidas sobre esse artigo ou sobre a análise do perfil de ácidos graxos do leite e o Qualidade, entre em contato com a Clínica do Leite (19) 3422-3631.
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