Como devemos monitorar a dieta dos nossos animais? Qual a importância e melhor maneira de estimarmos a ingestão de alimentos (consumo de matéria seca)? Uma vez que a alimentação é peça chave num sistema de produção de animais confinados, nada melhor do que monitorar o cocho e associar este ao desempenho dos animais.
Ao visitarmos propriedades, é bastante comum encontrarmos situações distintas quanto à qualidade do manejo da alimentação. A produção de leite e a otimização de um programa nutricional consistem na perfeita combinação entre diferentes fatores, dentre os quais destacamos: densidade da dieta (concentração de nutrientes), estágio de lactação e potencial genético do rebanho. Entretanto, por mais adequada que seja a integração destes três fatores, não podemos deixar de lado o manejo da alimentação, ou seja, como a comida chega à boca da vaca. Existem sistemas programados "perfeitos" no papel. Na prática, porém, os resultados obtidos não correspondem e, muitas vezes, sem motivo plausível. É nesta hora que deve entrar em ação o "olho clínico" ou a "mão do dono" como preferem dizer alguns. Assim, discutiremos a seguir como o monitoramento de cochos pode nos auxiliar no apuramento de um programa de alimentação de bovinos confinados.
Conceitos de cocho:
Para monitorarmos o cocho dos animais, primeiramente, devemos atentar para o lote que está sendo alimentado. Quanto mais homogêneo este for, em relação à idade da lactação e genética do rebanho, menor será a chance de errarmos e maior será a possibilidade de obtermos resultados.
O primeiro o a ser dado é quantificar a ingestão de alimentos. Como a matéria seca de forragens (inclusive silagens ao longo do perfil do silo) é variável e estas geralmente contribuem, na maioria dos casos, em pelo menos 40% da matéria seca (MS) total de dietas, o consumo das vacas também é variável. Desta forma, devemos conferir se a ingestão de matéria seca (IMS) estimada numa formulação, de fato, está ocorrendo na prática. Assim, a pesagem da sobra consiste numa "ferramenta" importante para quantificar consumo. Em função da variação da MS dos volumosos, a maneira mais correta seria amostrar a dieta, estimando a sua matéria seca. A MS pode ser quantificada na fazenda de modo simples e prático, com auxílio de forno microondas. Maiores informações e detalhes quanto esta metodologia prática podem ser obtidos em outro artigo também publicado no MilkPoint.
O exemplo a seguir ilustra tal conceito.
Ex: Fazenda A
Animais em lactação - 100
Estágio de lactação - 45 dias (média do lote)
Ingestão de matéria seca formulada (IMS) - 20 kg/cabeça/dia
Ingestão de matéria original formulada (IMO) - 40 kg/cabeça/dia
Teor de MS da dieta fornecida = 50%
Teor de MS da sobra = 52%
100 x 40 kg MO = 4000 kg MO = 2000 kg MS
Suposta sobra em material original (MO) = 240 kg
240 kg x 0.52 = 124.8 kg de MS
Sobra da dieta = 124.8/2000 = 6.2%
O exemplo acima seria a melhor maneira para se estimar o consumo no campo. Entretanto, nem sempre é possível conseguir este nível de precisão no dia a dia das fazendas. Caso o cálculo da MS da ração total fornecida não seja possível de ser efetuado na propriedade, para se ter um valor aproximado este cálculo poderá ser feito sobre a matéria original (destacamos que, do ponto de vista técnico, esta não é a melhor forma para esta estimativa). Logo, ainda no exemplo acima, considerando um volume hipotético de 40 kg de matéria original (MO) a ser fornecido por vaca, teremos um trato de 4000 kg de MO por dia. Podemos simplesmente pesar esta sobra e, estimar o consumo. Considerando uma sobra de 400 kg, por exemplo, obviamente a mesma foi de 10%. Apesar deste método não ser o mais adequado, ele pode ser bastante importante para a "calibragem" do olho do controlador de cocho da fazenda.
Controlador de cocho:
É importante que uma fazenda cujo regime de alimentação seja confinamento total, com mistura total da dieta, que haja uma pessoa qualificada para monitorar o cocho. Esta pessoa em muitas fazendas não existe. Em visitas, ao perguntarmos aos gerentes, quem controla o cocho, muitas vezes a resposta é: "Fixamos a quantidade a ser fornecida e quem faz o trato é o tratorista...". Destacamos que a escolha de uma pessoa qualificada tecnicamente, é muito importante para a execução desta função. Com a implantação de um controle de sobras, esta pessoa a a desenvolver um "olho clínico" do cocho e a a associar o volume de sobra no cocho com a porcentagem de sobra, sem a necessidade de pesagem de material. Seria um critério subjetivo, como a classificação do escore de condição corporal de vacas (ECC), por exemplo.
Controlando cochos - conceitos predominantes:
Em fazendas tecnificadas de leite, no mundo todo, o conceito de escore de cocho é bastante utilizado, sendo uma ferramenta indispensável ao dia a dia do manejo alimentar dos animais. A dúvida que surge está associada ao nível de sobra adequado. Primeiramente, destacamos que a avaliação da sobra, para ser representativa, deve ser feita uma hora antes do fornecimento de cada trato. Desta forma, o escore de cocho de referência mais adequado seria o 2, conforme tabela a seguir:
A tabela acima, principalmente no que se refere à espessura da camada de alimento remanescente (sobra) deve ser avaliada criteriosamente. Esta camada pode ser variável, de acordo com a natureza (composição) da dieta, mais precisamente em função características do volumoso fornecido e do tamanho de partículas do mesmo serem bastante variáveis. Logo, devemos atentar à porcentagem de sobra obtida com amostras práticas na própria fazenda vs. a "calibragem" do olho do controlador do cocho ("bunk reader" - "leitor do cocho").
O conceito embutido em se buscar o escore de cocho nº 2, está associado à idéia de que a vaca de leite não pode nem deve "ar fome". Algumas pesquisas indicam que o nível de sobra entre 5% e 10% é o ideal pois indica que a vaca comeu de acordo com a sua necessidade, "selecionando" (mesmo em dieta total), tranqüilamente o seu alimento. Se avaliarmos a qualidade da sobra de dietas com um escore 1 (menos que 5% de sobra), perceberemos que o material já apresenta uma consistência mais "grosseira", na maioria dos casos. Uma sobra superior a 10% representaria um excesso de comida. Desta forma, a recomendação tradicional é que o controlador do cocho faça a leitura sempre uma hora antes do trato e determine a quantidade de alimento a ser fornecida na seqüência. Um escore abaixo de 2, ou seja, uma sobra inferior a 5% exige, de imediato um acréscimo na alimentação. Este aumento deve ser de 1 kg de MS na dieta ou 5%. Para o controle deste manejo em fazendas, uma planilha (formato excel) pode auxiliar o trabalho. Ao ser formulada uma dada dieta para um determinado lote, a planilha de consumo pode indicar os acréscimos ou reduções dos ingredientes no vagão misturador (PARA OBTER MODELO DE PLANILHA NO FORMATO EXCEL,CLIQUE AQUI).
Na planilha anexa, de acordo com a dieta base, automaticamente, o controlador do cocho pode determinar a quantidade de cada ingrediente, por trato. Havendo uma sobra entre 5% e 10%, a quantidade fornecida é a da dieta-base. A quantidade oferecida não deve mudar. Havendo menos de 5%, deve-se aumentar em 1 kg de MS e aguardar (esperar sobra entre 5% e 10%). Após o aumento, novamente, se analisa o cocho e, havendo sobra inferior a 5%, aumentamos mais 1 kg de MS. O controlador pode promover aumentos superiores a 1 kg de MS, mas quando isso acontece, algo pode estar errado sendo muito provável, problemas com o teor de MS do volumoso (MS abaixo do formulado). Neste caso a MS do volumoso deve ser estimada e correções na dieta devem ser efetuadas.
Na parte 2 deste artigo a ser publicada, estaremos abordando novas teorias de escore de cocho, em prática em algumas fazendas, envolvendo conceitos diferentes em relação aos debatidos até o momento.
Fonte: dados do autor e Bovinews nº 1/Nutron Alimentos (1999)