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Resíduos clorados no leite, a origem do triclorometano e do clorato

Triclorometanos (TCM) e cloratos são resíduos clorados no leite. Mas qual é sua origem? Confira!

Publicado em: - Atualizado em: - 4 minutos de leitura

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Recentemente no Brasil algumas empresas já começaram a se preocupar com a presença de resíduos clorados no leite, entre eles os triclorometanos (TCM) e os cloratos. Como seria de se esperar, profissionais começam a me abordar preocupados com o cloro e a possível fonte de contaminação.

O processo de desinfecção da água recomendado em outros artigos deste blog não tem relação com a presença de resíduos clorados no leite. A água ingerida pela vaca contendo cloro não tem contato com o leite e é excretada normalmente e - mesmo assim - sem cloro, pois este cumpre sua função na água de eliminar a contaminação bacteriana e o pouco que resta é anulado pela presença de matéria orgânica de saliva no rúmen do animal.

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A água dos processos de higienização e limpeza, quando clorada - além de baixa concentração de cloro - também tem o composto neutralizado na operação quando em contato com qualquer tipo de matéria orgânica.

Fica então a pergunta. Qual a origem dos resíduos clorados no leite?

Empresas no Brasil ainda terão que pesquisar, mas estudos internacionais apontam contaminação relacionada ao processo de limpeza. A presença de TCM em alimentos foi associada anteriormente com água tratada contendo cloro (Rook 1974). No entanto, agora sabemos que as soluções de limpeza e desinfecção com cloro estão associadas a fonte de contaminação (Resch e Guthy 2000).

Os autores mostraram a formação de TCM em soluções de limpeza e desinfecção, principalmente quando:

  • estas (soluções de limpeza e desinfecção) são reaproveitadas em vários ciclos de higienização (pré e pós-lavagem) e;
  • o risco da contaminação principalmente pela orientação de não enxague com água limpa após o procedimento de higienização por parte de alguns profissionais.

A origem do triclorometano (TCM)

A reação clássica de formação do TCM é aquela que ocorre entre o cloro (um halogênio) e uma metilcetona para formar uma haloforma (Fuson e Bull 1934). Leite e produtos lácteos contêm acetoína, diacetil e outros metil-cetonas (Mick et al. 1982) que podem reagir com cloro para produzir TCM.

Os TCMs se acumulam em porções ricas de gordura, em produtos como leite e manteiga (Hubbert et al. 1991), frequentemente produzindo contaminações alimentares indesejáveis. Fleming-Jones e Smith (2003) concluíram que nos EUA, produtos derivados do leite continham os mais altos níveis de TCM, em comparação com outros produtos alimentares (um nível de 0,1 mg⁄kg, bem abaixo da concentração que seria considerada carcinogênica).

Ainda assim, visto que pode ser encontrado na água e outros alimentos, os limites máximos de TCM de <0,03 e <0,002 mg⁄kg de manteiga e leite, respectivamente, têm sido recomendados. Assim, é economicamente importante que países que buscam competir no mercado internacional atentem para estes limites.

Pontos de controle críticos para manter o TCM em níveis baixos no leite:

  • enxaguar com água entre cada ordenha após a desinfecção;
  • enxaguar com água limpa após ciclo de lavagem do detergente do esterilizador;
  • informe-se sobre o teor de cloro do detergente e não utilize em excesso;
  • controle a cloração da água utilizada para enxaguar e evitar excesso de cloro em águas “sujas” para compensar a contaminação;
  • evite muitas reciclagens da solução detergente-esterilizadora;
  • evite manter ordenhadeiras e outros materiais mergulhando em cloro por muito tempo;
  • evite reciclagem de água de enxágue.

A origem do clorato

O clorato por sua vez esta diretamente relacionado ou uso do hipoclorito de sódio (hipo). A grande maioria dos detergentes destinados a desinfecção são a base de hipo e muitos produtores ainda compram hipo concentrado para uso geral de limpeza. O hipo é naturalmente instável e se decompõe com muita facilidade. Fatores que influenciam na decomposição são:

  • concentração inicial: quanto maior a concentração maior será a decomposição inicial e formação de cloratos;
  • pH: quanto mais alto o pH mais estável o produto;
  • temperatura de estocagem: a temperatura tem forte influência na decomposição do produto. É muito importante que a estocagem seja coberta, em local fresco e arejado, e sem a incidência de luz solar;
  • luz solar: a luz também acelera a decomposição. Deve-se evitar e exposição de tanques e bombonas à luz solar;
  • contaminantes: o pior tipo de contaminação seriam os metais, principalmente níquel, cobre, ferro entre outros. Deve-se evitar o contato do hipo concentrado com equipamentos metálicos.

O produtor pode minimizar a decomposição por meio de alguns cuidados, mas nunca vai evitar totalmente que ela ocorra.

O que o produtor e as empresas devem ter em mente é que o cloro não é um produto milagroso. Sua aplicação deve seguir protocolos rígidos. Utilizar cloro em excesso para evitar contaminação além de desperdício de produto é correr o risco de contaminação por TCM e cloratos.

Uma atenção especial ainda deve ser dada para a fonte de água utilizada na propriedade. Não é raro me questionarem se adicionar mais cloro em uma água mais “suja”, com captação superficial, resolveria a contaminação. Não, o excesso de cloro vai promover outras contaminações como já descrito acima. Águas turvas ou com cor precisam ser filtradas e então cloradas.

Referências bibliográficas

SIOBHAN, R et al 2012. Evaluation of trichloromethane formation from chlorine-based cleaning and disinfection gents in cow’s milk

O’Brien, B 2017. Residues in milk

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Material escrito por:

João Luis dos Santos

João Luis dos Santos

Mestre em engenharia agrícola pela Unicamp/Feagri na área de concentração de águas e solo. Atua a mais de 15 anos no desenvolvimento de soluções e tecnologias para tratamento da água na produção animal. Diretor e fundador da Especializo.

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Bruno Vicentini
BRUNO VICENTINI

LAVRAS - MINAS GERAIS - PESQUISA/ENSINO

EM 26/02/2019

Há exatos 10 anos, um fiscal de inspeção de produtos de origem animal me alertou sobre o risco desse tipo de contaminação. Na época, ele percebeu que durante os processos de limpeza e sanitização as pessoas "carregavam no cloro" para tentar "melhorar a higiene"...
Também já li algo à respeito sobre a contaminação do leite com iodo, devido aos processos de pré e pós-dipping, quando não executados de forma correta...
João Luis dos Santos
JOÃO LUIS DOS SANTOS

CAMPINAS - SÃO PAULO - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 26/02/2019

Olá Bruno,

Obrigado por seu comentário e colaboração com o tema.
No artigo não quis aprofundar para não ficar extenso mas o iodo, assim como qualquer elemento da família dos HALOgênios, também podem formar os chamados THM.
Por isso são chamados de TriHALOmetamos.

Abraço e sucesso.
Bruno Vicentini
EM RESPOSTA A JOÃO LUIS DOS SANTOS BRUNO VICENTINI

LAVRAS - MINAS GERAIS - PESQUISA/ENSINO

EM 26/02/2019

Obrigado!!! Vou estudar mais sobre esse tema!!!
Qual a sua dúvida hoje?

Resíduos clorados no leite, a origem do triclorometano e do clorato

Triclorometanos (TCM) e cloratos são resíduos clorados no leite. Mas qual é sua origem? Confira!

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Recentemente no Brasil algumas empresas já começaram a se preocupar com a presença de resíduos clorados no leite, entre eles os triclorometanos (TCM) e os cloratos. Como seria de se esperar, profissionais começam a me abordar preocupados com o cloro e a possível fonte de contaminação.

O processo de desinfecção da água recomendado em outros artigos deste blog não tem relação com a presença de resíduos clorados no leite. A água ingerida pela vaca contendo cloro não tem contato com o leite e é excretada normalmente e - mesmo assim - sem cloro, pois este cumpre sua função na água de eliminar a contaminação bacteriana e o pouco que resta é anulado pela presença de matéria orgânica de saliva no rúmen do animal.

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A água dos processos de higienização e limpeza, quando clorada - além de baixa concentração de cloro - também tem o composto neutralizado na operação quando em contato com qualquer tipo de matéria orgânica.

Fica então a pergunta. Qual a origem dos resíduos clorados no leite?

Empresas no Brasil ainda terão que pesquisar, mas estudos internacionais apontam contaminação relacionada ao processo de limpeza. A presença de TCM em alimentos foi associada anteriormente com água tratada contendo cloro (Rook 1974). No entanto, agora sabemos que as soluções de limpeza e desinfecção com cloro estão associadas a fonte de contaminação (Resch e Guthy 2000).

Os autores mostraram a formação de TCM em soluções de limpeza e desinfecção, principalmente quando:

  • estas (soluções de limpeza e desinfecção) são reaproveitadas em vários ciclos de higienização (pré e pós-lavagem) e;
  • o risco da contaminação principalmente pela orientação de não enxague com água limpa após o procedimento de higienização por parte de alguns profissionais.

A origem do triclorometano (TCM)

A reação clássica de formação do TCM é aquela que ocorre entre o cloro (um halogênio) e uma metilcetona para formar uma haloforma (Fuson e Bull 1934). Leite e produtos lácteos contêm acetoína, diacetil e outros metil-cetonas (Mick et al. 1982) que podem reagir com cloro para produzir TCM.

Os TCMs se acumulam em porções ricas de gordura, em produtos como leite e manteiga (Hubbert et al. 1991), frequentemente produzindo contaminações alimentares indesejáveis. Fleming-Jones e Smith (2003) concluíram que nos EUA, produtos derivados do leite continham os mais altos níveis de TCM, em comparação com outros produtos alimentares (um nível de 0,1 mg⁄kg, bem abaixo da concentração que seria considerada carcinogênica).

Ainda assim, visto que pode ser encontrado na água e outros alimentos, os limites máximos de TCM de <0,03 e <0,002 mg⁄kg de manteiga e leite, respectivamente, têm sido recomendados. Assim, é economicamente importante que países que buscam competir no mercado internacional atentem para estes limites.

Pontos de controle críticos para manter o TCM em níveis baixos no leite:

  • enxaguar com água entre cada ordenha após a desinfecção;
  • enxaguar com água limpa após ciclo de lavagem do detergente do esterilizador;
  • informe-se sobre o teor de cloro do detergente e não utilize em excesso;
  • controle a cloração da água utilizada para enxaguar e evitar excesso de cloro em águas “sujas” para compensar a contaminação;
  • evite muitas reciclagens da solução detergente-esterilizadora;
  • evite manter ordenhadeiras e outros materiais mergulhando em cloro por muito tempo;
  • evite reciclagem de água de enxágue.

A origem do clorato

O clorato por sua vez esta diretamente relacionado ou uso do hipoclorito de sódio (hipo). A grande maioria dos detergentes destinados a desinfecção são a base de hipo e muitos produtores ainda compram hipo concentrado para uso geral de limpeza. O hipo é naturalmente instável e se decompõe com muita facilidade. Fatores que influenciam na decomposição são:

  • concentração inicial: quanto maior a concentração maior será a decomposição inicial e formação de cloratos;
  • pH: quanto mais alto o pH mais estável o produto;
  • temperatura de estocagem: a temperatura tem forte influência na decomposição do produto. É muito importante que a estocagem seja coberta, em local fresco e arejado, e sem a incidência de luz solar;
  • luz solar: a luz também acelera a decomposição. Deve-se evitar e exposição de tanques e bombonas à luz solar;
  • contaminantes: o pior tipo de contaminação seriam os metais, principalmente níquel, cobre, ferro entre outros. Deve-se evitar o contato do hipo concentrado com equipamentos metálicos.

O produtor pode minimizar a decomposição por meio de alguns cuidados, mas nunca vai evitar totalmente que ela ocorra.

O que o produtor e as empresas devem ter em mente é que o cloro não é um produto milagroso. Sua aplicação deve seguir protocolos rígidos. Utilizar cloro em excesso para evitar contaminação além de desperdício de produto é correr o risco de contaminação por TCM e cloratos.

Uma atenção especial ainda deve ser dada para a fonte de água utilizada na propriedade. Não é raro me questionarem se adicionar mais cloro em uma água mais “suja”, com captação superficial, resolveria a contaminação. Não, o excesso de cloro vai promover outras contaminações como já descrito acima. Águas turvas ou com cor precisam ser filtradas e então cloradas.

Referências bibliográficas

SIOBHAN, R et al 2012. Evaluation of trichloromethane formation from chlorine-based cleaning and disinfection gents in cow’s milk

O’Brien, B 2017. Residues in milk

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João Luis dos Santos

João Luis dos Santos

Mestre em engenharia agrícola pela Unicamp/Feagri na área de concentração de águas e solo. Atua a mais de 15 anos no desenvolvimento de soluções e tecnologias para tratamento da água na produção animal. Diretor e fundador da Especializo.

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Bruno Vicentini
BRUNO VICENTINI

LAVRAS - MINAS GERAIS - PESQUISA/ENSINO

EM 26/02/2019

Há exatos 10 anos, um fiscal de inspeção de produtos de origem animal me alertou sobre o risco desse tipo de contaminação. Na época, ele percebeu que durante os processos de limpeza e sanitização as pessoas "carregavam no cloro" para tentar "melhorar a higiene"...
Também já li algo à respeito sobre a contaminação do leite com iodo, devido aos processos de pré e pós-dipping, quando não executados de forma correta...
João Luis dos Santos
JOÃO LUIS DOS SANTOS

CAMPINAS - SÃO PAULO - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 26/02/2019

Olá Bruno,

Obrigado por seu comentário e colaboração com o tema.
No artigo não quis aprofundar para não ficar extenso mas o iodo, assim como qualquer elemento da família dos HALOgênios, também podem formar os chamados THM.
Por isso são chamados de TriHALOmetamos.

Abraço e sucesso.
Bruno Vicentini
EM RESPOSTA A JOÃO LUIS DOS SANTOS BRUNO VICENTINI

LAVRAS - MINAS GERAIS - PESQUISA/ENSINO

EM 26/02/2019

Obrigado!!! Vou estudar mais sobre esse tema!!!
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