Apesar dos grandes prejuízos causados pela mastite, as ferramentas de seleção genética têm tido pouca contribuição no controle da doença, o que pode ser parcialmente atribuído às limitações dos métodos de seleção atuais.
A principal métrica usada nas avaliações genéticas é o Escore Médio de Células Somáticas por Lactação (LSCS). No entanto, essa avaliação tem várias limitações que dificultam a seleção genética efetiva para resistência à mastite, pois assume que existe uma resposta uniforme de contagem de células somáticas frente a qualquer tipo de infecção. O LSCS é calculado com base na contagem de células somáticas (CCS) mensal durante toda a lactação, o que nem sempre captura a dinâmica das infecções intramamárias, pois a mastite subclínica pode ocorrer entre períodos de amostragem, levando a uma subestimativa da saúde do úbere. Por exemplo, vacas com mastite causada por bactérias Gram-negativas têm rápida resposta imune, sendo que as vacas resistentes são as que eliminam a infecção em curtos períodos, mas a CCS pode permanecer elevada por 10 a 50 dias, o que seria erroneamente interpretado como uma vaca menos resistente à mastite.
Além disso, o uso da CCS como indicador de mastite pode ter baixa sensibilidade, uma vez que outros fatores como idade da vaca, estágio da lactação e tipo de agente causador podem afetar a CCS, sem necessariamente indicar uma infecção. O uso de LSCS também tem limitação de não considerar que a persistência de baixa CCS ao longo da lactação pode ser um melhor indicador da saúde geral do úbere. Uma vaca com CCS consistentemente baixa ao longo da lactação pode ser considerada mais resistente à mastite do que uma com níveis flutuantes, mesmo que suas pontuações médias sejam semelhantes.
Diante dessas limitações, um estudo israelense testou o uso de um limite de CCS de <120.000 células/mL em vacas primíparas como uma característica para seleção de touros para melhorar a saúde do úbere. Dessa forma, as vacas foram classificadas em sadias (<120.000 células/mL durante toda a lactação) e não sadias (pelo menos um resultado de >120.000 células/mL) como um método alternativo para avaliação genética da resistência à mastite em comparação com o sistema LSCS atual.
O estudo foi conduzido em dois níveis. O primeiro estudo acompanhou dados de um único rebanho de 200 vacas leiteiras Holandesas com produção média de leite >11.500 L/305 dias de lactação, sendo que a produção mensal de leite, composição e CCS foram registradas desde o parto, com testes regulares de culturas microbiológicas e de CCS. O segundo estudo analisou dados de 89.000 novilhas Holandesas no mesmo período, as quais foram classificadas da mesma forma em sadias e não sadias (limite de 120.000 células/mL) em todos os nove registros mensais de leite e CCS, além das informações sobre os touros pais das vacas.
No estudo 1, com base na avaliação de rebanho único, as primíparas sadias tiveram significativamente mais partos, dias de produção e produção total de leite ao longo da vida em comparação com vacas com mastite clínica e subclínica. As análises do estudo em nível nacional indicaram que primíparas sadias, compreendendo 20,3% da população, tiveram maior produção de leite durante a vida produtiva, dias de produção e número de lactações significativamente maiores. Ao subdividir os conjuntos de dados por touros, foram observadas diferenças nas porcentagens de filhas sadias entre grupos de touros. Além disso, foi encontrada uma forte correlação positiva (r = +0,83, p < 0,001) entre a produção de leite ao longo da vida e o status de saúde do úbere.
O estudo demonstra que o uso de um limiar de CCS menor que 120.000 células/mL durante todas as medições da primeira lactação pode ser uma alternativa de avaliação de saúde do úbere em relação ao LSCS. Essa característica classificatória (sadia vs. não sadia) pode ser vantajosa para calcular o índice de mérito líquido ao longo da vida (NM$) em comparação com o sistema LSCS atual. A forte correlação entre o status de saúde do úbere e a produção de leite ao longo da vida sugere que a seleção para vacas sadias poderia levar a uma melhoria na longevidade e produtividade do rebanho. As diferenças observadas nas porcentagens de filhas sadias entre grupos de touros indicam um componente genético para a saúde do úbere que poderia ser explorado em programas de seleção genética.
Os autores destacam que as organizações de melhoramento genético devem considerar a incorporação de características como as avaliadas nesse estudo nos programas de avaliação genética para resistência à mastite. Pesquisas adicionais são necessárias para validar esses resultados em diferentes sistemas de produção e em outros países. Empresas de melhoramento genético poderiam desenvolver classificações de touros com base na porcentagem de filhas sadias, fornecendo aos produtores uma ferramenta adicional para selecionar touros com genética superior para saúde do úbere.
Em conclusão, este estudo apresenta uma característica alternativa para avaliação genética da resistência à mastite com base no mérito genético ao longo da vida produtiva. Ao valorizar a CCS consistentemente baixa ao longo da primeira lactação, oferece um critério de seleção potencialmente mais preciso e economicamente relevante para melhorar a saúde do úbere em rebanhos leiteiros.
Fonte: Leitner et al., Genes 2024. (Leia o artigo na íntegra: 10.3390/genes15010092)