Marcos Veiga dos Santos
Staphylococcus aureus é um dos patógeno causadores de mastite que mais causa prejuízo na bovinocultura leiteira. Os motivos que o caracterizam como um dos principais patógenos causadores de mastite são: redução da produção e da qualidade do leite; aumento da contagem de células somáticas (CCS); alta contagiosidade; produção de fatores de virulência; e alta resistência aos antimicrobianos.
No último artigo abordamos a patogenia e epidemiologia deste microrganismo. Neste artigo trataremos sobre temas relacionados à prevenção e controle da mastite causada por S. aureus, bem como, estratégias terapêuticas utilizadas no tratamento de mastite causada por este patógeno.
Prevenção e controle
O objetivo de um programa de controle de mastite causada por S. aureus deve ser direcionado na prevenção de novas infecções intramamárias (IIM) e/ou facilitar a eliminação de infecções existentes o mais rápido possível. O reservatório de infecção do S. aureus é a glândula mamária da vaca, o que faz com que a transmissão ocorra principalmente durante a ordenha.
A primeira estratégia para o controle da mastite causada por S. aureus é a manutenção da higiene de ordenha e realização de procedimentos adequados durante o período de extração de leite. Tais procedimentos incluem o uso de papel-toalha e luvas descartáveis, imersão dos tetos em solução desinfetante antes e após a ordenha, descontaminação do equipamento de ordenha após contato com uma vaca infectada ou realização de ordenha de vacas infectadas em uma unidade separada de ordenha. Outras práticas essenciais em nível de rebanho são a manutenção periódica dos equipamentos de ordenha e realização de exames microbiológicos que visam avaliar a condição sanitária do úbere de novilhas e vacas de reposição antes da inclusão desses animais no rebanho.
Em rebanhos onde tais práticas não apresentarem efeito sobre a redução das taxas de novas IIM causadas por S. aureus, medidas mais agressivas devem ser tomadas, como: segregação e ordenha de animais infectados; secagem antecipada de vacas ou secagem definitiva de quartos mamários infectados; descarte de vacas com IIM crônicas.
Conforme descrito no artigo anterior, alguns rebanhos apresentam um perfil genotípico heterogêneo de S. aureus causadores de IIM, o que indica que algumas espécies deste patógeno podem não ter a glândula mamária como reservatório principal. Desta forma, o conhecimento do perfil genotípico de IIM causadas por S. aureus poderia influenciar na decisão das práticas de manejo a serem adotadas em cada situação.
Considerando que a diferenciação genotípica não é uma ferramenta comercialmente disponível, a decisão correta sobre as práticas de manejo a serem tomadas dependerão do histórico prévio de IIM e do conhecimento epidemiológico do veterinário responsável pela sanidade das vacas no rebanho. A decisão de como manejar vacas com mastite causada por S. aureus em um determinado rebanho vai depender da contagiosidade, persistência e potencial inflamatório da cepa infectante. O histórico de infecções, CCS e o registro das respostas O tratamento com antimicrobianos em IIM prévias são ferramentas importantes que podem auxiliar na decisão de manejo frente a novos casos de mastite causada por S. aureus.
Tratamento
Muitas estratégicas terapêuticas têm sido avaliadas para o tratamento da mastite causada por S. aureus, as quais incluem terapia antimicrobiana intramamária estendida, terapia antimicrobiana sistêmica, e terapia combinada de vacinação e antimicrobianos. Estudos demonstraram que as taxas de cura da terapia antimicrobiana contra S. aureus variam de 3-74%, dependendo do produto utilizado, período de tratamento, e momento de istração dos medicamentos (durante a lactação ou período seco, e em caso de novilhas, logo antes do parto).
A probabilidade de cura de IIM causadas por S. aureus depende de fatores em nível de vaca, cepa causadora e tratamento utilizado. Além disso, a taxa de cura está associada com a idade e estágio de lactação das vacas, CCS, cronicidade da infecção, contagem bacteriana e número de quartos mamários infectados. O tratamento durante a lactação de vacas primíparas com IIM causada por S. aureus pode ser economicamente justificado devido à maior taxa de cura e melhor resposta do sistema imune de animais jovens. Já o tratamento durante a lactação de vacas mais velhas, com infecções crônicas, ou com isolados resistentes à penicilina, na maioria das vezes, não é recomendável.
Um dos fatores relacionados com a cura de vacas com IIM causada por S. aureus é a duração do tratamento. Um estudo recente sobre a terapia antimicrobiana de vacas com mastite causada por S. aureus durante a lactação concluiu que a terapia estendida (5 a 8 dias) com antimicrobianos intramamários aumentou a taxa de cura em 47%. No entanto, ao se optar pela terapia estendida deve-se considerar o risco de IIM por outros patógenos como leveduras e coliformes, principalmente se não forem tomadas precauções de higiene durante a aplicação dos medicamentos. Além disso, mesmo com protocolos terapêuticos de oito dias, a taxa de cura em longo prazo pode não ser a esperada em alguns rebanhos. Um estudo demonstrou alta taxa de cura (80%) em quartos mamários após quatro dias do término do tratamento intramamário, no entanto, aos 28 dias a maioria das infecções reincidiu e a taxa de cura caiu para 29%.
Outra estratégia de tratamento que pode ser utilizada durante a lactação é a terapia combinada por meio da aplicação de antimicrobianos sistêmicos e intramamários. O objetivo desta terapia é aumentar a concentração da droga nos locais da infecção por período prolongado e, por consequência, elevar as taxas de cura. Um estudo demonstrou que a taxa de cura de vacas com mastite causada por S. aureus tratadas com o uso de antimicrobianos intramamários durante a lactação foi de 25%, enquanto vacas submetidas a uma terapia combinada apresentaram taxas de cura de 51%. Para aumentar as chances de cura de IIM com o uso desta estratégia terapêutica, os medicamentos (sistêmico e intramamário) devem atuar em sinergismo no organismo animal. Além disso, a droga sistêmica deve se difundir ivamente para a glândula mamária e ter ação na presença de detritos e debris inflamatórios.
Protocolos com a utilização de vacinação combinada com antimicrobianos intramamários também têm sido usados no tratamento de IIM causadas por S. aureus. O regime de tratamento proposto envolve a vacinação contra S. aureus aos 2 e 14 dias antes da data do tratamento intramamário. Após aplicação das duas doses de vacina, procede-se o tratamento intramamário com antimicrobianos durante seis dias. Sete dias após o término do tratamento intramamário, aplica-se nova dose da vacina. Com o uso desse protocolo, um estudo demonstrou taxa de cura de 80% dos quartos infectados.
O tratamento pré-parto de novilhas com antimicrobianos intramamários é uma estratégia terapêutica que vem sendo utilizada principalmente em rebanhos com alta prevalência de mastite em vacas primíparas em início de lactação. Neste tipo de protocolo terapêutico, as novilhas são geralmente tratadas com antimicrobianos intramamários de 2-4 semanas antes do parto com o objetivo de eliminar IIM causadas primariamente por Staphylococcus coagulase negativa. No entanto, alguns resultados positivos foram observados em casos de IIM causadas por S. aureus. Enquanto as taxas de cura com o uso deste protocolo podem ser promissoras, o impacto desta terapia no desempenho de vacas primíparas, em comparação com vacas não tratadas, varia de rebanho para rebanho. Além disso, assim como na terapia estendida, deve-se tomar cuidado com o risco de transmissão de IIM secundárias, principalmente em sua forma clínica.
Várias estratégias são utilizadas atualmente para prevenção e tratamento de IIM causadas por S. aureus. Entretanto, é importante ressaltar que protocolos de terapia estendida e combinada, bem como tratamento intramamário durante o período pré-parto devem ser realizados com orientação de um médico veterinário.
Fonte: Middleton, J. R. Staphylococcus aureus mastitis: have we learned anything in the last 50 years? Proceedings National Mastistis Council Regional Meeting, Portland, Maine, p. 1-8, 2003.
*Doutorando do Programa de Pós-graduação em Nutrição e Produção Animal, FMVZ-USP.