A relação de troca entre o preço do leite e a arroba do boi gordo é um importante termômetro para os produtores rurais. Quando essa relação se deteriora para o leite – isto é, quando são necessários mais litros de leite para equivaler ao preço de uma arroba – há uma tendência maior ao abate de vacas. Nesses momentos de valorização da arroba, os produtores encontram uma oportunidade de obter melhores margens financeiras vendendo cabeças para o abate em detrimento da produção leiteira, principalmente de animais menos produtivos e já próximos do descarte.
Gráfico 1. Evolução da relação de troca litros de leite/arroba de boi gordo 2021-2024.
Fonte: MilkPoint Ventures, CEPEA/ESALQ.
No gráfico acima é possível notar que, ao longo do período de janeiro de 2021 até outubro de 2024, a relação de troca ou por variações significativas. Em momentos de alta acentuada da relação, como observado no final de 2021 e meados de 2022, a quantidade de leite necessária para equivaler a uma arroba chegou em torno de 160 litros, o que pode ter levado muitos produtores a optarem pelo abate de vacas, dado o estímulo financeiro. Esse fator provavelmente contribuiu para a forte redução da captação de leite no Brasil que vimos na primeira metade de 2022, por exemplo.
Por outro lado, quando o preço do leite está em alta, como visto nos últimos meses, há maior valorização do setor e desestimulo à saída da atividade/venda de animais.
A elevação da relação de troca litro de leite / @ bovina constatada desde junho/24 chama a atenção, em especial no último mês. Inegavelmente, houve piora na relação de troca. Entretanto, os valores ainda não alcançaram a média histórica de 120 litros/@. Isso significa que, apesar do forte aumento no preço da arroba, o momento de preço do leite mais valorizado faz com que essa relação ainda siga mais positiva para a atividade leiteira. Quando essa relação se aproxima ou ultraa essa média, o estímulo ao abate tende a ser maior, já que os produtores de leite se sentem mais atraídos a venderem parte do seu rebanho para o abate. Como essa relação ainda se mostra favorável para o leite, os produtores seguem tendo incentivos para manter o rebanho na atividade leiteira, ao menos no curto prazo.
Caso a valorização da arroba continue nessa crescente e o preço do leite volte a perder força, poderemos ver uma mudança mais significativa, com maior volume de abates e impacto na oferta de leite - um cenário que pode ser mais provável para o próximo ano, visto que a pecuária é uma atividade de ciclo longo que responde de forma lenta aos estímulos externos, como o clima, por exemplo.
Essa possível mudança se relaciona diretamente ao ciclo pecuário, caracterizado por períodos de alta e baixa nos preços do gado. De forma simplificada: quando os preços da arroba estão altos, o abate de animais, incluindo as fêmeas, se torna mais estimulado, o que aumenta a oferta de carne e provoca uma queda nos preços. O abate de vacas, por sua vez, impacta a oferta futura de bezerros ao reduzir a reposição de animais para reprodução e, posteriormente, gerando uma escassez de gado pronto para abate. Com o tempo, esse processo força uma nova valorização do gado, reiniciando o ciclo – movimento que está começando a ser vislumbrado agora.
No momento, a produção de leite tende a seguir relativamente estável e com um preço ainda atrativo para os produtores segurarem grande parte dos seus rebanhos, todavia é importante manter a atenção para a evolução dessa relação de troca nos próximos meses.
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