O que causa estresse nas vacas leiteiras?
A natureza é sabia. Quando existe uma situação de estresse, o organismo das vacas diminui a fertilidade, pois entende que, se ela não tem recurso nem para ela, nem para o bezerro que já nasceu, quem dirá para um próximo? Se o estresse for mais grave, o vai leite cair. Por quê? Porque fisiologicamente somos egoístas. O corpo prioriza a mãe e não o filho. Se a situação for mais estressante ainda, aí sim a saúde da mãe começa a pagar. Em geral, é mais ou menos isso que acontece com nossas vacas e tudo isso está ligado ao estresse que elas am.
Já comentei algumas vezes que quando falamos de combate ao estresse, não é apenas estresse térmico, mas sim todo tipo de estresse que uma vaca possa sofrer ao longo de sua vida. Desde mudanças de dieta, lote, movimentação diária, vacinação, manejos, etc. Existem dois hormônios importantes para entender como isso acontece e dos quais provavelmente você já ouviu falar: adrenalina e cortisol. A adrenalina é um hormônio de liberação rápida, porém de menor duração. Já o cortisol é um hormônio de estresse crônico, ou seja, demora para subir e demora a cair. Quero falar hoje um pouco sobre os efeitos do cortisol. Você vai ver que ele não é nada bem-vindo e por muitas razões.
Efeitos do cortisol em vacas leiteiras
Um exemplo de ação da adrenalina é que ela corta o efeito da ocitocina (hormônio da descida do leite), naturalmente produzido após estimulo correto das vacas na ordenha. O problema da adrenalina não é apenas seu efeito no momento, mas que, com adrenalina constante, provavelmente o cortisol também vai aumentar. É aí que o problema começa. Cortisol por muito tempo na circulação prejudica a absorção de nutrientes e diminui o número e capacidade de células do sistema imune, além da habilidade de termorregulação (animais estressados tendem a ser mais sensíveis ao estresse térmico). Satisfeito? Não?! Cortisol também prejudica a secreção de hormônios reprodutivos importantes, como LH e FSH, entre tantos outros efeitos. A consequência disso você consegue imaginar?
O cortisol surge como um alerta do organismo de que o sistema de emergência está ligado. É como se as vacas estivessem 100% do tempo prontas para fugir, gastando energia e sabotando a própria saúde sem necessidade nenhuma. É importante você terminar esse artigo com clareza de como esse sistema de emergência se ativa e como desativá-lo.
Pois bem, então o que ativa esse sistema de alarme? Tudo o que for estressante para o animal. Tudo que o tire de sua natureza. Vacas são animais que gostam de rotina, são metódicas, comilonas e lentas. Tudo que atrapalhe essa natureza vai fazer com que haja liberação de cortisol. Por isso levanto tanto a bandeira de que conforto não é apenas a construção de um barracão! Conforto é respeitar o instinto dos animais. Se você entender isso, suas vacas dificilmente irão adoecer ou produzir pouco leite. Assim, queremos que todos os acontecimentos normais na vida de um animal sejam menos estressantes, para que o cortisol se mantenha em níveis aceitáveis.
Daí você pensa: “Ahhhhh, mas aqui em casa eu tenho sim um barracão muitíssimo bem projetado”. Pois bem, então eu te digo que isso não garante tudo, pois o manejo do barracão e dos animais é tão ou mais importante que a construção. Desde a maneira como se conduz as vacas para a ordenha, como se maneja o gado em dia de vacinação ou BST, se há uma sala de banho, se o local onde ficam tem água fresca, se a comida é farta e realmente boa etc. Enfim... se você, produtor ou produtora, não se atentar a esses pontos, é como se tivesse um resort para as vacas, mas seus hospedes estão estressadíssimos.
É possível medir cortisol no sangue dos animais?
Sim, mas além de trabalhoso é desnecessário, porque as vacas nos mostram se elas estão com cortisol alto. Se elas estão adoecendo especialmente no pós parto, se estão apáticas, se estão demorando a se recuperar do parto ou "sentido demais" o momento da parição, se a conversão alimentar está aquém, se não deitam, se disputam comida etc. Todos estes são sinais claros de que o gado está estressado e provavelmente o cortisol está alto. Os índices na fazenda são apenas um reflexo disso.
Se você não tem barracão, não pense que apenas ele vai resolver e que não há nada mais para ser feito. Leia um artigo anterior a esse que fala sobre a possibilidade de oferecer conforto para vacas fora do barracão. Portanto, se elas estão a pasto, é importante você criar a cultura na sua fazenda de tratar bem as hóspedes (vacas), dar melhor comida, cumprir rigorosamente a rotina delas etc. Isso pode ajudar muito a baixar o nível de estresse (cortisol), mesmo se não for possível construir um hotel 5 estrelas.
Vejo muitas fazendas querendo discutir a gotícula de água do resfriamento na linha de cocho, o detalhe do detalhe, mas, quando olho o cocho, a comida está mal misturada, as vacas estão disputando espaço, há disparidade de escore corporal, não há padrão na hora do trato, a dieta é cada dia de um jeito. Tradução: não adianta dar banho em vaca que está ando fome! A intenção é maravilhosa, mas você precisa ver a coisa como um todo. Para isso é necessário bastante maturidade empresarial.
O cortisol rouba muito leite do tanque, muita saúde e longevidade das nossas fazendas. É desafiador contornar essa situação contando com o clima brasileiro, mas é possível. Na verdade, é uma das premissas para que sua fazenda rode bem. Vacas com cortisol baixo têm reprodução mais fácil, respondem melhor às bactérias do ambiente e aos tratamentos, sentem menos calor, enfim... uma dádiva! Começo e termino o texto afirmando: a natureza é sabia! Se pararmos de atrapalhar as vacas já faremos um excelente trabalho!
Acabo por aqui esperando de coração que o recado tenha sido claro. Um forte abraço e aguardo comentários e sugestões aqui embaixo!