Dentre os agentes virais mais importantes estão o Vírus da Diarreia Viral Bovina (BVDV), Herpesvírus bovino-1 (BoHV-1), Vírus da Parainfluenza Bovina tipo 3 (PI-3), Vírus Respiratório Sincicial Bovino (BRSV), e Coronavírus respiratório bovino (BCoV). Os vírus respiratórios IBR, BVDV, PI-3 e BRSV invadem os tecidos do trato respiratório superior, promovendo rinites (inflamação seios nasais), traqueítes (inflamações na traqueia) e bronquite (inflamação nos brônquios) - aumentando as possibilidades de invasão bacteriana secundária nos pulmões.
Os agentes bacterianos mais importantes são a Mannheimia (antigamente chamada de Pasteurella) haemolytica, Pasteurella multocida e Histophilus somni. Dentre os micoplasmas estão o Mycoplasma bovis, Mycoplasma díspar, Mycoplasma bovirhinis. E os agentes parasitários mais comuns são o Dictyocaulus viviparus e os Ascarídeos.
As bezerras infectadas pelos agentes virais, como BoHV-1, PI-3, BVDV e BRSV, além do Mycoplasma spp. são mais propensas à desenvolverem broncopneumonias graves quando expostas à M. haemolytica. Este agente possui muitos fatores de defesa que o protege dos mecanismos imunológicos do animal, além de produzir uma toxina (leucotoxina) que promove uma inflamação e destruição do tecido pulmonar. Conforme já salientado, a detecção precoce dos casos de DRB é extremamente importante, pois quanto mais rápido iniciado o tratamento melhores serão as chances de recuperação do animal e menores serão os prejuízos.
Na maioria das vezes, as discretas alterações que ocorrem nas fases iniciais da doença não são detectadas pelos funcionários dos bezerreiros, já que o apetite dos animais dificilmente se reduz e pode não haver tosse. Contudo, dois indicadores de comportamento podem ser avaliados na tentativa de se identificar bezerras com possíveis quadros iniciais de pneumonia, como levar mais tempo do que as outras para ingerir o leite do balde e permanecer mais tempo em pé após o aleitamento. Estes comportamentos podem acontecer pois os animais doentes am a respirar mais pela boca do que pelo nariz, dificultando a ingestão do leite, e ainda por dor no tórax ao deitarem.
Assim, pensando em facilitar a identificação da fase inicial das broncopneumonias em bezerras, a Profa. Sheila McGuirk, da Universidade de Wiscosin (EUA) elaborou um sistema de pontuação que une parâmetros de avaliação que podem ser facilmente visualizados pelo produtor (Quadro 2).
Quadro 2 - Escore para a detecção precoce de broncopneumonias na criação de bezerras. Clique na imagem para ampliar*
Para cada parâmetro avaliado (temperatura retal, tosse, secreção nasal, secreção ocular e posicionamento das orelhas) deverá ser atribuída uma pontuação (zero a 3,0). Ao final da avaliação, a pontuação total será determinada a partir da soma dos pontos atribuídos para cada parâmetro, interpretando-se da seguinte forma:
Quadro 3 - Interpretação resumida do escore de doença respiratória (McGuirk, 2008).
A reavaliação dos animais após cinco ou seis dias de tratamento pode determinar quais bezerras foram curadas ou quais necessitam de tratamentos adicionais, assim como determinar quais bezerras podem ser transferidas para outros lotes ou categorias. Este monitoramento também previne a disseminação dos agentes causadores da doença respiratória no rebanho, uma vez que os animais identificados permanecerão isolados e não serão transferidos para outros ambientes íveis de haver disseminação. Vale ressaltar que o sucesso na utilização deste sistema está intimamente relacionado ao nível de treinamento dos funcionários da fazenda e quando bem realizado, consegue identificar mais de 85% dos animais que necessitam de tratamento.
Além do sistema de pontuação, o exame mais detalhado do sistema respiratório pode ser realizado pelo médico veterinário da fazenda, para a determinação do diagnóstico da DRB. Exames laboratoriais, necropsias, radiografias e ultrassonografias também podem ser realizados.
Em virtude da complexidade da DRB, a escolha do tratamento ideal para cada indivíduo se torna difícil. Além disso, o tratamento visa controlar as infecções causadas por bactérias, pois não existe até o momento medicamentos eficazes de combate aos vírus. O protocolo de tratamento da fazenda deve ser elaborado pelo médico veterinário responsável pelo sistema de criação. Em geral, as principais medicações utilizadas no tratamento da DRB envolvem os antibióticos (antimicrobianos), anti-inflamatórios, mucolíticos (fluidificantes), fluidoterapia e oxigenioterapia.
Os fundamentos básicos do tratamento antimicrobiano para as broncopneumonias envolvem tratar o mais rápido possível, por tempo suficiente e com o medicamento apropriado. Dentre as principais razões para o insucesso no tratamento, a demora no início da terapia pode ser citada como sendo a principal delas, uma vez que permite que as lesões evoluam de tal forma que comprometa a eficácia do tratamento.
Podem ser utilizados protocolos contemplando uma única ou múltiplas istrações de antibióticos, o importante é que o medicamento forneça entre cinco a seis dias de cobertura (duração da ação do medicamento). No Quadro 4 está apresentado o resultado obtido após ser testada a eficácia de alguns antibióticos muito utilizados no tratamento da DRB contra três agentes bacterianos.
Pode-se verificar que a tetraciclina não exerce mais efeito sobre os agentes estudados, e isto deve servir de alerta considerando o uso indiscriminado de antibióticos nas criações, pois muitas vezes o tempo de lançamento de novas drogas no mercado é muito maior do que o próprio desenvolvimento de resistência bacteriana aos medicamentos disponíveis atualmente.
Quadro 4 - Eficácia de diferentes antibióticos frente aos agentes bacterianos envolvidos com a DRB.
Os anti-inflamatórios podem ser usados na tentativa de reduzir a febre e a inflamação do trato respiratório, sendo que o mais utilizado nesta situações é a flunixina meglumina, por poder ser utilizado juntamente com qualquer antibiótico, sem inativá-lo. Os mucolíticos auxiliam na eliminação das secreções acumuladas nas vias aéreas e associados aos broncodilatadores aliviam a dificuldade respiratória.
As bezerras doentes devem receber alimentos de melhor qualidade. A hidratação de bezerras doentes e que estejam com dificuldade para se alimentarem também é importante, pois além de corrigir a desidratação pode estimular a ingestão de alimentos. Existem algumas formulações hidratantes disponíveis no mercado que podem ser diluídas na água ou no leite e fornecidas na mamadeira, mas em casos mais graves a indicação da hidratação é por via intravenosa.
A metafilaxia para a doença respiratória consiste no tratamento de animais que apresentam grandes chances de desenvolverem doenças respiratórias - antes que a mesma se manifeste. Pode ser realizada - por exemplo - no momento da transferência dos animais para outras categorias ou introdução das bezerras no calf feeder (aleitamento automático). Pode-se ainda istrar a medicação dias antes do previsto para o início da doença, mas para isto é importante se analisar os dados da fazenda e identificar o período de maior risco.
A metafilaxia tende a ser mais eficaz do que os tratamentos apenas dos indivíduos que manifestem clinicamente a doença, uma vez que alguns animais doentes podem não apresentar sintomas ou ainda, quando houver, estes podem ser discretos. Alguns medicamentos podem ser usados na terapia metafilática, como o fosfato de tilmicosina, a tulatromicina e a gamitromicina. Alguns estudos verificaram que a utilização desta prática reduziu a porcentagem de animais doentes e melhorou o desempenho, considerando o ganho de peso e aumento do consumo alimentar. Por outro lado, a metafilaxia apresenta ressalvas pois pode induzir resistência bacteriana aos antibióticos utilizados, devendo portanto, ser introduzida na fazenda sempre com orientação do médico veterinário.
A vacinação tem sido utilizada na prevenção das doenças respiratórias, entretanto, não existem vacinas disponíveis contra todos os agentes infecciosos implicados no complexo DRB. Atualmente, vacinas comercializadas no Brasil contém os vírus IBR, BoHV-1, BVDV, PI-3 e BRSV, sendo poucas as que apresentam as bactérias P. multocida, M. haemolytica e H. somni. As bezerras vacinadas pelas vias subcutânea ou intramuscular apresentam pobre produção de anticorpos após a vacinação devido à influência dos anticorpos maternos adquiridos pela ingestão do colostro. O anticorpo da mãe elimina o antígeno (estímulo) vacinal antes mesmo que ele estimule o sistema imune do recém-nascido.
Recentemente foi lançada no Brasil uma vacina de aplicação intranasal. A vantagem da vacina nasal é que ela pode ser istrada já no primeiro dia de vida da bezerra, pois não sofre influência e bloqueio pelos anticorpos colostrais maternos. Este tipo de vacina induz imunidade na mucosa do trato respiratório e pode agir contra os vírus causadores das pneumonias, mais especificamente IBR, PI-3 e BRSV. É válido ressaltar que a vacina nasal não possui BVDV, assim protocolos com a vacina injetável deverão ser elaborados para garantir a proteção para a Diarreia Viral Bovina.
Conclusões
Este artigo reforça que a adequada gestão das doenças respiratórias em uma fazenda leiteira deve envolver a identificação dos fatores de risco existentes, monitoramento dos sintomas compatíveis com a fase inicial da doença, revisão dos protocolos de colostragem e vacinação. Todos estes fatores juntos devem ser analisados pelo pessoal envolvido, para que protocolos possam ser traçados ou ajustados, potencializando os índices produtivos e garantindo a sanidade das bezerras nesta importante etapa de criação.
Confira a primeira parte deste artigo:
Sanidade na criação de bezerras: dos 31 dias ao desmame - Parte IIIa
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