Ao constatar que o sistema tradicional de produção de leite, em pequenas propriedades, produtividade mediana, mão-de-obra escassa e poucas possibilidades de expansão e mesmo sobrevivência representava um desafio para a continuidade da atividade, a cooperativa buscou na Galícia, Espanha, um modelo de condomínio que buscava elevar a escala da atividade e viabilizar a permanência dos produtores.
O condomínio de Nova Bréscia envolve 16 famílias que se juntaram, criando uma empresa onde as cotas são determinadas pelo valor dos rebanhos aportados. Os produtores também são responsáveis por produzir o volumoso (silagem, feno, pré-secado).
O sistema de produção é o confinamento total, em free stall, com ordenha robótica e alimentação de grãos automatizada. São 3 robôs para a ordenha automatizada de cerca de 215 vacas, com 3 funcionários na operação. O investimento foi de R$ 5 milhões, com financiamento da Finep, como um projeto inovador. Vale lembrar que, conforme colocou Carlos Alberto de Figueiredo Freitas, presidente Executivo da Dália Alimentos (Cosuel), “é preciso fazer ajustes na linha Inovagro, como por exemplo permitir que se financie equipamentos importados como é o caso da ordenha robótica, que não é fabricada no Brasil (a ordenha da DeLaval vem da Suécia), bem como da extensão do prazo para pagamento do financiamento, já que é um investimento de longo prazo.”
A empresa formada, chamada de Condomínio dei Produttori Di Latte Brescia, paga mensalmente à cooperativa o equivalente a 0,5% do investimento de R$ 5 milhões a título de uso das instalações, além dos demais custos de produção (equivalente a cerca de R$ 0,12-0,13/litro de leite, considerando a produção final). Futuramente, há a possibilidade do Condomínio assumir o financiamento e ser proprietário das instalações e equipamentos. A Cosuel também é a responsável pela istração técnica.
A Prefeitura da cidade teve papel fundamental ao adquirir a área de 13 hectares, fazer a terraplanagem, furar um poço artesiano e disponibilizar a linha de energia elétrica na propriedade. A estimativa, segundo informado, é que a arrecadação de impostos cresça 168% quando o projeto estiver amadurecido, em quatro anos, com produção diária de 6500 kg, com média de 30 kg/vaca/dia.
O pavilhão central, dividido em pista de alimentação, área de camas e sala de espera, tem capacidade para 262 animais. No momento encontram-se alojados 115 animais em lactação e 66 vacas secas e novilhas. A produção atual é de 2,5 mil litros.
O projeto, sem dúvida, traz desafios, não só pela tecnologia empregada, mas também pela pioneirismo do arranjo realizado entre os produtores e a cooperativa. Aspectos de governança precisarão ser muito bem trabalhados, já que o condomínio envolve 16 famílias (e seus descendentes), provavelmente com pouca experiência neste tipo de organização, além da própria cooperativa.
Isso, porém, não tem freiado as atividades da Cosuel no sentido de oferecer uma solução de futuro para seus cooperados. Além deste primeiro condomínio, mais 3 estão em fase de construção, seguindo os mesmos princípios: Roca Sales, Arroio do Meio e Candelária, todos localizados na Serra Gaúcha.
Entrevista: Igor Carlos Weingartner, gerente da Divisão Produção Agropecuária (DPA) da Dália
MilkPoint: O projeto envolve um investimento considerável. Em relação a custos de produção por litro, a Cosuel imagina que haverá acréscimo, manutenção ou redução de custos de produção em relação ao que os produtores têm hoje? Por que e em quais itens haverá variação?
ICW: "Nós não sabemos qual eram os custos de produção dos produtores antes de entrarem no projeto. Todos eles possuíam estrutura (propriedade), gastos com mão-de-obra, manutenção, depreciação, médias de produção baixas e um volume relativamente pequeno de leite por produtor, o que resulta em um custo de produção elevado. Porém não sabemos exatamente qual era o custo de produção desses produtores. Ao entrarem no condomínio tudo será contabilizado, alguns custos novos surgirão e outros aumentarão devido ao investimento em automação, porém acreditamos que com o aumento das médias produtivas, a otimização da mão-de-obra e o ganho de escala de produção conseguiremos equilibrar essa equação".
MilKPoint: O projeto estima também ganhos de preço e qualidade. Quais seriam estes impactos na rentabilidade?
ICW: "Sim, a Dália Alimentos bonifica o preço pago aos seus produtores sócios de acordo com o desempenho da qualidade, sanidade, composição e volume de leite. Com o projeto pretendemos alcançar o máximo de bonificação nos quatro itens e isso será fator determinante para viabilidade do projeto. Se considerarmos apenas a bonificação por volume de leite, um produtor que entrega para a cooperativa 10.000 litros por mês, ganha R$ 0,15 centavos a menos por litro quando comparado com um produtor de 40 mil litros por mês, sem considerar qualidade, ou composição, apenas litragem. Ao juntarmos os produtores no projeto associativo, conseguiremos alcançar o máximo de bonificação por volume. Ainda um outro fator importante para viabilização do projeto é o aumento das médias de produção. Nossa meta é chegar a 30 litros de leite vaca/dia. A média de produção nas propriedades variavam de 10 a 20 litros de leite vaca dia".
MilkPoint: Dentro disso, em quanto a renda dos produtores poderá aumentar, caso os índices de eficiência sejam atingidos, em comparação à renda atual?
ICW: "Nosso objetivo é garantir a mesma renda que eles tinham antes de entrar no projeto, porém agora com menos trabalho e para gerações futuras. Muitos produtores estavam prestes a deixar a atividade devido a problemas de idade avançada e falta de sucessão. Agora são sócios de um empreendimento que poderá durar para sempre".
MilkPoint: O projeto tem o subsídio das Prefeituras e, de certa forma, da Cooperativa, ao intermediar sem custos o financiamento do projeto e oferecer a assistência técnica. O projeto seria sustentável sem essa condição?
ICW: "A cooperativa investiu e cobrará aluguel de acordo com o valor investido. O grande incentivo da Cosuel está em organizar essa estrutura e captar os recursos para construção do empreendimento. Assim como qualquer negócio, existem riscos nessa operação e esses riscos foram assumidos pela empresa. A remuneração do capital investido ocorrerá pela cobrança do aluguel. A prefeitura investiu na área de terras, terraplenagem, perfuração do poço artesiano. Os produtores, parte fundamental nessa operação, entraram com o rebanho e também com os riscos econômicos de fazer o negócio rodar e dar dinheiro (obs: cerca de R$ 1,2 milhão em animais). Acredito que se não fosse o esforço conjunto desses três organismos, nada disso teria acontecido e ainda estaríamos discutindo os problemas que atividade leiteira enfrenta no Brasil e como um número grande de produtores está deixando produção de leite. Acredito que qualquer modelo de produção coletivo, quando bem gerido, organizado de maneira igual ou diferente da maneira que organizamos o nosso projeto, é mais eficiente do que um produtor isolado".
MilkPoint: O projeto envolve uma organização em que são participantes 16 famílias e a cooperativa. Como será a governança? Há uma estrutura de comando definida?
ICW: "A governança é igual a de uma empresa tradicional com um quadro acionário composto por vários sócios. Existem funcionários contratados dentre eles um chefe que coordena as atividades dentro da granja. A Dália Alimentos dá o e técnico. Os produtores possuem uma direção formatada (presidente, vice-presidente etc) que acompanha o andamento dos trabalhos. Se a direção não estiver satisfeita com o que está ocorrendo na granja ela aciona o chefe da granja e o e para que medidas sejam tomadas".
MilkPoint: É possível quantificar aproximadamente o investimento da Prefeitura?
ICW: Não tenho essa informação correta. A prefeitura acabou investindo bastante em terraplenagem porque o terreno é bastante acidentado.
MilkPoint: Até que ponto esse modelo pode ser replicado?
ICW: "Acredito que a essência do projeto é facilmente replicada, quando digo essência me refiro na junção de produtores, criação de uma sociedade, cotas, valorização de rebanho, produção de alimento etc... Agora, se imaginarmos a réplica do projeto exatamente como o que a Dália Alimentos criou, acho mais difícil. É um projeto robusto, com grandes investimentos e que envolveu uma parceria público-privada. O município teve que ar o projeto pela câmara de vereadores. A Dália Alimentos teve que buscar linhas de crédito específicas para financiar a importação de equipamentos e isso só ocorreu porque todas essas entidades entenderam que a ideia era boa e que estava sendo conduzida por uma empresa séria".
MilkPoint: A Dália Aimentos pretende fazer outros projetos além desses 4, ou o intuito é testar o modelo e, conforme for, estimular outros grupos parecidos, porém sem a participação direta da cooperativa?
ICW: "A Dália não irá mais fazer outros projetos. O intuito é testar o modelo e estimular que grupos se organizem por conta própria inspirados no que já foi aprendido com os 4 grupos que montamos".