De acordo com dados do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA), a produção de leite abrange 98% dos municípios brasileiros e emprega aproximadamente 4 milhões de pessoas. Segundo dados de 2022 da FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentos) o Brasil é o sexto maior produtor mundial, com uma produção de cerca de 34,8 milhões de toneladas de litros de leite. No entanto, apesar de números expressivos, o setor enfrenta desafios em termos de eficiência produtiva e qualidade do leite in natura, o que afeta sua competitividade.
De maneira geral, o leite cru costuma apresentar níveis elevados de microrganismos aeróbios mesófilos e coliformes, o que sugere deficiências nas práticas de higiene durante a produção. A contagem desses microrganismos aeróbios mesófilos, também conhecida como Contagem Bacteriana Total (CBT) é de extrema importância, pois serve como indicador de qualidade e fornece informações sobre a eficácia das práticas de higiene durante a coleta e manutenção do leite.
Além disso, a contagem de células somáticas (CCS) também se tornou um parâmetro de qualidade, pois as células somáticas são indicadoras de que as células de defesa migraram para as glândulas mamárias para combater agentes causadores da mastite.
Nos últimos anos surgiu o sistema de pagamento por indicadores de qualidade do leite, uma abordagem utilizada por muitas indústrias de laticínios para incentivar os produtores de leite a entregar um produto de melhor qualidade, garantindo preços mais altos pelo litro de leite entregue. Esse sistema considera que indicadores como CCS e CBT afetam diretamente a qualidade do produto final, sua vida útil, processamento e valor agregado.
Nesse sistema, as indústrias coletam amostras regularmente do leite fornecido por cada produtor e enviam para laboratórios especializados para mensurar CCS e CBT. Com base nos resultados das análises, são atribuídas pontuações aos produtores: quanto mais baixos os níveis de CCS e CBT, melhor a qualidade do leite. Os produtores que mantêm baixos níveis de CCS e CBT são recompensados financeiramente.
A qualidade inferior do leite cru, bem como dos leites pasteurizado, esterilizado e seus derivados, pode ser atribuída a uma série de fatores, incluindo deficiências no manejo e na higiene durante o processo de ordenha, altos índices de mastite, manutenção e desinfecção inadequadas dos equipamentos, falta de refrigeração eficiente ou inexistente e a presença de mão de obra desqualificada, dentre outros aspectos relevantes. Para que haja valorização do leite é essencial adotar ações adequadas desde antes da ordenha até o processamento do leite, a fim de reduzir a contaminação.
Ações que podem ser adotadas
Currais: são parte das instalações que podem acumular um grande número de micro-organismos, os pisos bem como os comedouros e bebedouros devem ser mantidos limpos. Destinar adequadamente os resíduos (diariamente deve haver remoção de fezes, urina e restos de alimentos) evita a contaminação do ambiente.
Se o sistema utilizado for o Compost Barn deve-se utilizar equipamentos adequados, como tratores e pás carregadoras, para a remoção eficaz dos resíduos. Deve-se manter uma cama de material adequado (como serragem, palha ou areia) que ofereça conforto e absorção de umidade com adição de material novo regularmente para manter a cama limpa e seca. É necessário que o Compost Barn tenha um sistema adequado de drenagem para evitar o acúmulo de água e lama, os canais de drenagem devem ser monitorados regularmente para garantir um fluxo adequado.
Sala de ordenha: a limpeza diária do local de ordenha e um bom sistema de escoamento de resíduos são essenciais para evitar a formação de lama e reduzir a sujidade no úbere das vacas, pois minimizar a presença de fezes e lama nas áreas frequentadas pelas vacas é essencial. A área destinada a ordenha deve ser ventilada, sem poeira e com baixa umidade.
Higiene na rotina de ordenha: garantir que a higiene seja rigorosamente seguida durante todo o processo de ordenha melhora muito os índices que mensuram a contaminação. Lavar bem as mãos dos ordenhadores antes da ordenha deve fazer parte do processo. Em seguida devemos proceder com a limpeza dos tetos antes da ordenha, para isso, é necessário cobrir completamente a superfície dos tetos com uma solução pré dipping que se for uma solução clorada, é necessário deixar agir nos tetos por 30 segundos.
Caso os tetos estejam sujos, é recomendado lavá-los antes ou utilizar uma solução de ácido lático. A secagem dos tetos, sempre que necessária, deve ser feita com papel-toalha, considerando que deve ser um pedaço de papel para cada teto. Por fim, deve-se fazer o pós dipping dos tetos ao finalizar a ordenha, cobrindo pelo menos 2/3 do teto com a solução contendo iodo glicerinado. E ainda, realizar ordenha completa, garantindo que todo o leite seja retirado dos tetos.
Fonte: ideagri
Implementar um programa de monitoramento regular da saúde do úbere e do leite: para identificar e tratar imediatamente casos de mastite, seguindo as orientações veterinárias. Utilizar os testes de caneca de fundo telado em cada ordenha e o California Mastitis Test (CMT) uma vez por semana, no mínimo, para sempre ordenhar vacas mais saudáveis primeiro. Haverá um diagnóstico da saúde do rebanho no que diz respeito a mastite, e assim, identificando animais doentes, as vacas com mastite clínica e aquelas em tratamento com antibiótico ficam por último na ordenha, descartando o leite, para evitar contaminação de vacas sadias e evitar resíduos de medicamentos no leite.
Manutenção dos equipamentos de ordenha: é essencial realizar a limpeza e higienização do equipamento com detergentes específicos, seguindo o tempo de ação e a temperatura corretos. É recomendado substituir as mangueiras de leite a cada 6 meses ou 2500 ordenhas e as mangueiras de vácuo a cada 12 meses ou 5000 ordenhas. Antes da ordenha, é importante garantir que os recipientes que recebem o leite (baldes ou tanque, incluindo todo o sistema de agem) estejam limpos e higienizados adequadamente.
O manejo adequado dos animais também é essencial: evitar estresse excessivo nas vacas durante a ordenha além de garantir alimentação balanceada, conforto e bem-estar trazem benefícios e mais saúde ao rebanho. As mudanças bruscas no ambiente e manejo das vacas devem ser evitadas, os animais devem ter instalações adequadas para descanso e abrigo que proporcionem conforto. O estresse é conhecidamente o maior inimigo do sistema imunológico, vacas estressadas terão maior probabilidade de desenvolverem mastite. E ainda, considere também que uma dieta balanceada e nutricionalmente adequada é capaz de fortalecer o sistema imunológico das vacas reduzindo casos de mastite na propriedade.
Lembre-se de que a implementação dessas medidas requer um compromisso constante com a qualidade e o bem-estar animal. Um plano abrangente de controle de mastite, com base nas orientações técnicas corretas e boas práticas reconhecidas, é fundamental para o sucesso na redução da CBT e CCS em fazendas de gado leiteiro e consequentemente, melhor valorização no preço pago pelo leite.
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Autores
Fernanda Teixeira de Souza - Discente do curso de Medicina Veterinária, UFRRJ, Membro LiBovis;
Louise Cristine Carneiro de Almeida - Discentes do curso de Medicina Veterinária, UFRRJ, Membro LiBovis;
Ana Paula Lopes Marques - Orientadora, LiBovis-UFRRJ
Bibliografia recomendada:
DIAS, J. A.; BELOTI, V.; OLIVEIRA, A. M. de. Ordenha e boas práticas de produção. Pecuária leiteira na Amazônia. Brasília, DF. Embrapa, 2020. Cap. 6, p. 105-130. Disponível em:
FAGNANI, R. Resumão das INs 76 e 77 de qualidade do leite. MilkPoint. 2019. Disponível em:
MENEGHATTI, M. R.et al. Impactos do sistema de pagamento por qualidade do leite em uma cooperativa da agricultura familiar. DRd-Desenvolvimento Regional em Debate, v. 10, p. 1203-1234, 2020. Disponível em: < http://www.periodicos.unc.br/index.php/drd/article/view/2963>